Tag Archives: Vulnerabilidade Social

Inscrições para Mais Médicos terminam nesta quinta-feira (8)

São 3.174 vagas para profissionais em regiões vulneráveis

As inscrições para o programa Mais Médicos terminam nesta quinta-feira (8). O Ministério da Saúde está ofertando 3.174 vagas para médicos interessados em trabalhar na atenção primária à saúde em regiões prioritárias, remotas, de difícil acesso e de alto índice de vulnerabilidade, onde há escassez ou ausência desses profissionais.

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Estudo aponta impacto étnico-racial no desenvolvimento infantil

Existem diferentes parâmetros para avaliar o desenvolvimento de uma criança desde seu nascimento, e o ganho de peso e altura é um desses fatores. No entanto, há influências indiretas que atuam sobre esse fator do desenvolvimento. Isso é o que aponta um novo estudo publicado por pesquisadores do Centro de Integração de Dados e Conhecimento para Saúde (Cidacs/Fiocruz Bahia). Os achados da pesquisa sugerem que a etnia/cor da gestante afeta a trajetória de ganho de peso e crescimento de seus filhos. Em especial, o estudo alerta para uma maior desigualdade em relação ao desenvolvimento infantil de filhos de mulheres indígenas.

Publicada no periódico BMC Pediatrics, a pesquisa constatou que filhos de mães indígenas exibiram maiores taxas de baixa estatura para a idade (26,74%) e baixo peso para a idade (5,90%). Características de magreza foram mais prevalentes entre crianças filhas de mães pardas e pretas (5,52% e 3,91%, respectivamente), indígenas (4,20%) e de descendência asiática (5,46%), em relação às crianças filhas de mulheres brancas (3,91%).

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Covid-19 traz impactos para primeira infância nas 16 favelas da Maré. Crianças de 0 a 6 anos correspondem a 12,4% dos moradores

A pandemia da covid-19 trouxe grandes impactos para as crianças do complexo das 16 favelas da Maré, na zona norte do Rio de Janeiro, em especial da primeira infância, que abrange menores de 0 a 6 anos de idade, em questões de saúde, alimentação, educação, segurança. É o que revela o Diagnóstico Primeira Infância nas Favelas da Maré, divulgado nesta quarta-feira (27) pela organização não governamental (ONG) Redes da Maré. A população de 0 a 6 anos corresponde a 12,4% dos moradores da Maré, ou o equivalente a quase 15 mil crianças. A primeira infância é considerada uma fase crucial para o desenvolvimento das crianças.

Durante a pandemia, foram aplicados diretamente 2.144 questionários às famílias, nas residências, além de realizadas entrevistas com profissionais de redes de proteção e apoio à primeira infância, como professores, assistentes sociais e profissionais de saúde. O objetivo foi traçar o panorama da situação da realidade de 2.796 crianças nessa faixa etária. Muitas famílias possuíam mais de uma criança nessa idade, informou à Agência Brasil a assistente social Gisele Martins, uma das coordenadoras do estudo. De acordo com o Censo feito em 2013 pela Redes da Maré, o complexo possui 140 mil moradores no total.

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Foto destacada: Estudo MINA/divulgação

Mesmo em locais de maior vulnerabilidade social a atividade física na gestação deve ser estimulada

Pesquisadores da USP acompanharam um grupo de gestantes na Amazônia Ocidental. Análises mostram que a prática de ao menos 150 minutos semanais de exercícios está associada a uma redução saudável do peso do bebê, com menor risco de obesidade e diabetes na infância

Um estudo brasileiro reforça o valor e a segurança das atividades físicas no lazer durante a gravidez, inclusive em um cenário de maior vulnerabilidade social. Com base em dados de gestantes de uma cidade no Acre, os pesquisadores associaram a prática de ao menos 150 minutos de exercícios por semana, como recomendado pela Organização Mundial da Saúde, a uma redução do peso do bebê no nascimento, o que é positivo para evitar consequências como obesidade e diabetes na infância. E isso sem aumentar o risco de a criança nascer com peso abaixo do esperado para a idade gestacional.

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“Não há solução mágica contra as drogas”, afirma especialista da Fiocruz

Em entrevista para a Agência Fiocruz de Notícias (AFN), o coordenador-executivo do Programa Institucional Álcool, Crack e Outras Drogas da Fundação Oswaldo Cruz, Francisco Netto, apresentou um panorama geral da questão da redução de danos no Brasil e na América Latina.  Ele analisou também a situação que tem se desenrolado na Cracolândia, em São Paulo. De acordo com Netto, não há solução mágica para o uso problemático de drogas: a saída é a garantia de direitos, o acesso ao cuidado e a inserção social.

A conversa aconteceu durante o Seminário Internacional: Cenários da Redução de Danos da América Latina, que foi realizado nos dias 29 e 30 de maio, na Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz), no Rio de Janeiro. O evento foi dedicado à troca de experiências e reflexões sobre a redução de riscos e danos associados ao uso problemático de drogas. No primeiro dia de encontro foram debatidas as novas práticas e o contexto histórico da redução de danos no continente. Ao final do seminário, que contou com a presença de especialistas de diversos países da América Latina, foi divulgada a Carta de Manguinhos, abordando a situação atual das políticas de redução de danos e suas interfaces na América Latina.

Como o Programa Institucional Álcool, Crack e outras Drogas, da Fiocruz, enxerga a questão das drogas atualmente?

Francisco Netto: A realidade global, e também nacional, é que há uma expressiva prevalência do uso de drogas lícitas e ilícitas. Pessoas usam substâncias que alteram a consciência. Isso é uma realidade e não tem como fugir dela. Não é factível que todas as pessoas deixem de usar substâncias. Então um dos objetivos do programa é apoiar ações que reduzam os danos associados ao uso, ou seja, que aquelas pessoas que não querem ou podem parar de usar estejam expostas a menos riscos e danos decorrentes do uso prejudicial.

Como os países com participantes no Seminário Internacional lidam com o problema?

Francisco Netto: Em todos o uso de álcool é a maior questão. A situação do uso de cocaína é importante, particularmente o uso de cocaína fumável por pessoas em situação de extrema vulnerabilidade, que no Brasil é majoritariamente o crack. Há diferenças entre os países, mas todos lidam de alguma forma com esta questão. A verdade é que nem eles nem nenhum estado ou cidade brasileira vive uma situação parecida com o que acontece em São Paulo, onde existe uma concentração grande em um único território, a área central cidade, no bairro da Luz. Há uma maior dispersão das cenas de uso, em diferentes graus. O problema de uso de drogas é complexo e a solução nunca pode ser dada de forma simples. Não existe uma solução mágica para o problema. Nenhum país conseguiu ter uma solução simples. O caminho que a gente acredita e defende no Programa Institucional Álcool, Crack e Outras Drogas e que compartilhamos com outros profissionais de outros países é a lógica do cuidado e da inserção social. Pensamos o cuidado entendendo que algumas das pessoas não vão conseguir parar de usar drogas e vão necessitar de cuidados e estratégias de inserção e proteção, porque o uso de substâncias psicoativas pode implicar em riscos e danos àquela pessoa.

Qual país teve pelo menos uma redução mínima dos danos?

Francisco Netto: Os lugares onde houve uma redução de danos a relação do uso de crack foi em São Paulo e Recife, com o Programa De Braços Abertos e Atitude, respectivamente. Em São Paulo, na gestão anterior, havia um programa que pensava em trazer moradia, geração de renda e outros tipos de elementos de inserção social para os usuários. Há pesquisas que indicam que houve uma redução significativa no uso de substâncias durante o programa, assim como em Recife com o Atitude. Em contrapartida, os meios que têm sido usados atualmente em São Paulo são completamente ineficazes no ponto de vista da saúde, de tentar evitar o uso com repressão e internações compulsórias em massa, chegando ao ponto de derrubar muros com pessoas ainda dentro das casas, sendo atingidas por escombros. Havia um caminho e um avanço pela lógica da inserção social, da garantia de moradia e da garantia dos direitos dessas pessoas.

Além do programa feito na gestão anterior em São Paulo e em Recife, existe, em algum outro lugar, um programa que deu certo?

Francisco Netto: Os países europeus e os países norte-americanos têm experiências bem interessantes. Há uma diferença porque lá a substância que é mais usada e que gera um impacto maior à saúde é a heroína, que não está significativamente presente aqui no Brasil e na maioria dos países da América Latina, exceto a Colômbia e México. O caminho construído nos países europeus, assim como no Canadá,  segue a linha do que nós acreditamos. Eles formularam que, para as pessoas que não conseguem parar de usar, a melhor forma para poder reduzir os danos do uso é garantir que o Estado possa acompanhar as pessoas. Ou seja, há salas de uso seguro, que o Estado disponibiliza para as pessoas, o que garante que não haja overdoses e transmissão de doenças por seringas contaminadas. Isso garante também que haja uma diminuição muito grande da transmissão de doenças e, na verdade, é esse o caminho que acreditamos ser bom. Obviamente, entendemos que quando uma pessoa quer parar de usar uma droga é necessário – e a gente tem que ter sempre em mente isso -, diversos procedimentos e instrumentos que ajudem o indivíduo a parar de usar a droga.

Vimos a Cracolândia, uma área degradada, que agora sofre de interesses da especulação imobiliária. E o problema se espalhou para 23 pontos. Aqui no Rio de Janeiro também vemos. Qual a solução?

Francisco Netto: Qualquer um que afirmar que existe uma solução simplista não estará falando a verdade. Do nosso ponto de vista, são ações de cuidado e garantia de direitos que devem ser implementadas. De forma mais ampla, devemos reduzir desigualdades e reduzir a vulnerabilidade social dessas pessoas. O que se fez recentemente em São Paulo não vai acabar com a situação no bairro da Luz. Essas pessoas certamente vão se reagrupar – não muito longe de onde estavam. Você pode se preocupar em fechar um quarteirão e logo outra parte próxima dali vai acabar se configurando como novo espaço de uso. Esse tipo de ação só serve para fazer com que certas áreas ganhem valorização imobiliária. Então, não tem uma preocupação com a saúde das pessoas e não tem preocupação com a sociedade. Porque na verdade não se está garantindo que as pessoas em situações de vulnerabilidade estejam melhores. É a partir de um olhar de cuidado, da saúde, que a gente tem que encarar a questão de drogas, não é por meio de repressão nem de uma lógica criminalizante que conseguiremos resolver o problema. Então, temos que entrar com uma lógica de inserção social dessas pessoas, e não de afastar. Não se pode fazer limpeza social que tire as pessoas de nossas vistas, isso definitivamente não resolve em nada o problema.

Pesquisas mostram como o não acesso à água e ao esgoto afeta outros direitos sociais

Sete anos após a Organização das Nações Unidas (ONU) ter declarado o acesso à água e ao esgotamento sanitário como um direito humano fundamental, uma pesquisa realizada na Fiocruz Minas mostra que a violação dessa prerrogativa afeta uma série de outros direitos sociais, como educação, saúde e até mesmo o direito de ir e vir. O estudo, desenvolvido pela doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva Priscila Neves, teve como foco a população em situação de rua do município de Belo Horizonte e, por meio de uma análise qualitativa, apontou que, devido à precariedade no acesso à água e ao esgotamento sanitário, tal público acaba sendo excluído de outras esferas da vida social e econômica.

Intitulada Direitos humanos e vulnerabilidade social: o acesso à água e ao esgotamento sanitário de pessoas em situação de rua, a pesquisa ouviu, no período de maio a julho de 2016, 24 pessoas (14 homens; 10 mulheres) que vivem na região central de Belo Horizonte. De acordo com a pesquisadora, os entrevistados declararam beber água proveniente de doações e recorrer às bicas e às fontes de água localizadas nas praças do município, para lavar roupas e se higienizar. Elas também disseram que se sentem muito mal por andarem sujas e deixam de ter acesso a serviços de saúde e de frequentar a escola porque nem sempre têm como tomar banho.

“Alguns dos entrevistados usam a expressão ‘lixo’ para dizer como se sentem. Aqueles que frequentam a Educação de Jovens e Adultos (EJA) revelaram faltar às aulas sempre que não podem tomar banho. Outros disseram que, ao procurar serviços de saúde, são orientados a fazer uma higiene corporal e, depois, procurar o atendimento novamente, o que acaba resultando em perda de assistência. E também foram vários os relatos de pessoas que disseram ser impedidas de entrar em um estabelecimento comercial para pedir um copo d´água por estarem sujas”, conta Neves. “Ou seja, a violação do direito à água viola também o direito à educação, à saúde, entre outros”, pontua.

Outro aspecto apontado pela pesquisa é que a falta de acesso ao esgotamento sanitário retira das pessoas o direito à privacidade. A maior parte dos entrevistados revelou defecar e urinar a céu aberto. Segundo a pesquisadora, eles também relataram que albergues e abrigos deixam de ser uma opção, justamente por não oferecem privacidade. “Os espaços que existem na cidade não dão conta da demanda e, mesmo quando há vagas, eles disseram não se sentir à vontade porque os banheiros não têm porta”, afirma.

De acordo com a pesquisa, para as mulheres, a situação pode ser ainda mais difícil porque, além de terem a intimidade escancarada, ainda sofrem assédio sexual. Depoimentos dão conta de que água e instalações sanitárias são, em algumas situações, colocadas como objeto de barganha em troca de favores sexuais.

“Todas essas questões fazem com que a população em situação de rua não se sinta pertencendo à sociedade. Isso fica claro porque muitos entrevistados usam o termo “sociedade” dando a entender que é algo externo a eles, da qual não fazem parte. E a falta de participação social leva ao acirramento das desigualdades”, destaca Neves.

Água, esgotamento e a desigualdade entre gêneros

Os resultados da pesquisa vão ao encontro das informações constantes do relatório Igualdade de gênero e direitos humanos à água e ao esgotamento sanitário, elaborado pelo relator especial da ONU sobre esses direitos, Léo Heller, que também é pesquisador da Fiocruz Minas. O documento destaca que água e esgotamento sanitário não estão acessíveis de forma equivalente para homens, mulheres e outras identidades de gênero e que tal situação leva a outras desigualdades.

Divulgado no fim do ano passado, o relatório aponta que, em quase todas as localidades onde há falta ou má distribuição de serviços de saneamento, a tarefa de coletar água para manter a higiene do lar é atribuída às mulheres, o que leva a outros problemas.

“Isso subtrai delas um tempo que poderia estar sendo empregado em educação e em atividades remuneradas. Tal situação reforça a dependência econômica com homens, interferindo, inclusive, na capacidade delas de pagar por serviços de água e esgotos”, explica Heller. Segundo ele, meninas e mulheres também experimentam o stress psicossocial, causado pelo medo da violência sexual, bem como de serem atacadas por animais nas zonas rurais, durante a atividade de transportar a água e ao se dirigirem a locais para defecação.

Por falta de espaços adequados, de acordo com o pesquisador, as mulheres também costumam reter a urina por longos períodos de tempo, o que pode aumentar o risco de infecções de bexiga e rins. A inadequação dos espaços públicos também atinge os transgêneros que, ao usarem instalações sanitárias separadas pelo sexo biológico, ficam expostos a agressões morais e físicas.

Serviços

Os impactos negativos gerados pela falta de acesso à água e ao esgotamento sanitário reforçam a importância de se promover uma ampla discussão sobre a forma como esses serviços são oferecidos. Entretanto, nos últimos meses, uma série de ações aponta para mudanças na política de saneamento do Brasil sem que tenha ocorrido nenhum debate com a sociedade. Exemplo disso é edital lançado recentemente pelo o governo federal, por meio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), com o objetivo de contratar estudos técnicos para concessão à iniciativa privada de serviços de saneamento básico em 18 estados. Já no Rio de Janeiro, a Assembleia Legislativa do Estado aprovou, no mês de fevereiro, um projeto de lei permitindo a privatização da Companhia Estadual de Água e Esgoto (Cedae).

“Trata-se de uma reorientação na atual política de saneamento que está sendo feita sem qualquer discussão e sem que se tenha realizado uma revisão de experiências nas diversas regiões do mundo. França, Alemanha e Argentina são exemplos de países que estão remunicipalizando os serviços porque a experiência com a iniciativa privada não deu certo. Os motivos foram vários: preço elevado, descumprimento de contratos, serviço centrado no lucro, entre outros”, destaca Heller.

O pesquisador ressalta que os serviços oferecidos atualmente também estão longe do ideal. Segundo ele, a crise de abastecimento de água ocorrida nos últimos anos em diversos Estados do Brasil deixou claro que faltam planejamento e investimento em infraestrutura, capazes de evitar perdas e garantir o abastecimento nos períodos em que o volume de chuvas é baixo.

“As mudanças climáticas ocorrem, e o planejamento tem que levar isso em consideração. Além disso, o sistema de água tem muitas perdas, por exemplo, por vazamento. Hoje, mais da metade da água adequada para consumo não chega às casas; perde-se”, afirma.

Para a pesquisadora Maria Inês Pedrosa Nahas, do Grupo de Políticas Públicas e Direitos Humanos em Saúde e Saneamento da Fiocruz Minas, quando a água deixa de chegar aos domicílios, quem sofre primeiro as consequências do desabastecimento é a população de baixa renda e de pouca escolaridade. Nahas está à frente de um estudo que vem sendo realizado na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), com o intuito de estruturar um sistema de indicadores, tendo em vista o objetivo 6 da Agenda Global 2030, que é “assegurar a disponibilidade e gestão sustentável da água e saneamento para todos”. A pesquisa avalia o estágio em que os municípios se encontram em relação ao alcance das metas propostas para o cumprimento desse objetivo.

“O tema da falta de água ganha destaque quando o problema atinge a classe média. Entretanto, uma parcela significativa da população convive com essa questão diariamente. Em alguns municípios da RMBH, falta acesso à água ou ao esgotamento adequado em quase 100% das casas”, revela.

A pesquisa, que faz uma análise dos dados coletados nos censos demográficos realizados pelo IBGE nos anos de 2000 e 2010, indica que, além da renda e da escolaridade, o fato de estar situado em área urbana ou rural influencia no acesso à água e ao esgotamento. Por exemplo, em 2010, 97% dos domicílios localizados na área urbana eram atendidos adequadamente pelo serviço de abastecimento de água; enquanto, na área rural, esse percentual era de 84%.

“Já em relação ao esgotamento sanitário, eram 89% com acesso adequado na área urbana e apenas 37% na área rural”, afirma Arlete Soares, do Grupo de Políticas Públicas e Direitos Humanos em Saúde e Saneamento. “Se essa disparidade acontece entre os municípios da Região Metropolitana de BH, imagine em localidades mais distantes”, avalia.

No Brasil, segundo o Sistema Nacional de Informação sobre Saneamento, o percentual de pessoas com solução adequada para o abastecimento de água é de 83%. Em relação à coleta de esgoto esse número cai para 50% e, no que se refere a tratamento de esgotos, desce para 42%. “Tudo isso tem impacto na saúde, na qualidade de vida e também no meio ambiente. Problemas relacionados ao esgotamento sanitário adequado significam esgoto indo para os cursos d´água”, lembra Léo Heller.

Desigualdade social é principal motivo de mortes por tuberculose

Mesmo estando disponíveis no Brasil, recursos para prevenção e tratamento da doença não alcançam a população com maior vulnerabilidade social

Foto: Leon Rodrigues/Secom/PMSP

Estudo realizado pela Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto (EERP) da USP em parceria com o Instituto de Higiene e Medicina Tropical (IHMT) de Lisboa, Portugal, aponta que a desigualdade social tem forte impacto na mortalidade por tuberculose.

De acordo com dados do Ministério da Saúde, o Brasil ocupa a décima oitava posição no ranking entre os 22 países que concentram 80% dos casos de tuberculose, com 73 mil novos diagnósticos e 4.477 mortes por ano. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), esses números são injustificáveis, pois o sistema de saúde do Brasil possui todos os recursos necessários para o diagnóstico e tratamento da doença.

Para entender esse descompasso, o professor Ricardo Alexandre Arcêncio, da EERP, e a professora Inês Fronteira, do IHMT, iniciaram estudo para saber quais os motivos que levam a tuberculose a fazer tantas vítimas. Os resultados mostraram que a causa não é única. O fator mais relevante é a falta de acesso aos recursos da área da saúde, que, mesmo existentes, não alcançam a população com maior vulnerabilidade social, consequentemente, a mais atingida pela doença.

Multidroga-resistência

A multidroga-resistência acontece quando o bacilo (bactéria) se torna resistente aos dois principais medicamentos para tratamento da doença. A ciência já comprovou que, atualmente, isso acontece em várias doenças, inclusive a tuberculose, e se dá por conta do uso indiscriminado de antibióticos. Outro fator que leva à multidroga-resistência da tuberculose é a falta de investimentos da indústria farmacêutica, como relata Arcêncio. “Como é uma doença da pobreza, a indústria farmacêutica não está interessada em desenvolver novos fármacos para a tuberculose.

“A medicina está utilizando os mesmos antibióticos de 1960.”

Outro dado apontado pelo estudo dos pesquisadores lusófonos é a relação direta da tuberculose com o vírus do HIV. Dos 22 países que mais têm concentração de pessoas com tuberculose, quase todos também têm um quadro preocupante de HIV. “O HIV é fator de risco para o desenvolvimento da tuberculose, que é uma doença oportunista”, explica o professor.

Compromisso de diminuição de 95% dos casos

Recentemente, o Brasil firmou compromisso com a OMS de reduzir, até 2035, 95% dos óbitos por tuberculose por meio da estratégia Fim da TB. No entanto, para os pesquisadores, isso é pouco provável de se concretizar. Segundo Arcêncio, o estudo evidenciou a dificuldade dos municípios de conseguir alcançar essa meta, uma vez que a redução do número de óbitos caminha a passos mais lentos do que prevê a OMS. “Se continuarmos nesse ritmo, essa meta será atingida apenas em 2200”, alerta o professor. Para a professora Inês, a intervenção deve ser também social e não apenas no tratamento.

Melhorar a qualidade de vida das pessoas e os quadros de desvantagem social e pobreza é o ponto principal.”

A pesquisadora é enfática ao afirmar que essas melhorias não afetariam somente a tuberculose, mas outras doenças negligenciadas, como o HIV, por exemplo. “Se melhorar a qualidade de vida, como o saneamento básico e as condições de moradia, já diminuiria entre 20% e 30% a taxa de mortalidade, como mostra o projeto”, afirma o professor Arcêncio.

PALOPs

Foto: Carol Garcia/AGECOM via Fotos Públicas

Orientadora de trabalhos em países africanos de língua portuguesa (PALOPs) em parceria com o IHMT, a professora se diz preocupada com o cenário que encontra nesses lugares. Segundo a pesquisadora, o coeficiente de incidência da tuberculose em Angola e Moçambique, por exemplo, chega a 400 casos por 100 mil habitantes, enquanto no Brasil a média é de 40.

A pesquisadora ainda participou de intervenções na África Austral, Angola e Moçambique, para incentivar essas regiões a adotarem os padrões mínimos de abordagem da tuberculose e outras doenças. Informações sobre identificação dos casos, encaminhamento e diagnóstico são os principais pontos abordados nos trabalhos realizados e orientados por Inês nesses países.

Com o objetivo de contribuir com a formação dos profissionais desses países, Inês lembra sobre a importância que pesquisas na área da saúde têm para aquelas populações. “Temos uma aluna que vai apresentar a situação epidemiológica da tuberculose na Luanda, capital da Angola. É um estudo basicamente simples, em que ela analisou quantos casos existem, de onde as pessoas vêm, quais são as características. Pode parecer um estudo muito básico, mas nesses países, onde não há essas informações, esse estudo tem uma relevância muito grande.”

Inês Fronteira faz parte do IHMT, do Centro Colaborador da OMS para a Política de Pessoal de Saúde e Planejamento e da Associação de Gestão de Saúde da Europa. Esse estudo é realizado por meio do Projeto Regular da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) em desenvolvimento atualmente em parceria com o Instituto de Higiene e Medicina Tropical (Universidade Nova de Lisboa-Portugal) e Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto (EERP) da USP, denominado A mortalidade por tuberculose e sua relação com iniquidades sociais: um estudo multicêntrico.

Stella Arengheri, de Ribeirão Preto

Mais informações: email ricardo@eerp.usp.br  ou ifronteira@ihmt.unl.pt

Mapas associam ocorrência de diarreia com vulnerabilidade social

Pesquisa pode ajudar o poder público a conhecer melhor a cidade e a direcionar os recursos de modo mais pontual

Pesquisa da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP buscou relacionar a vulnerabilidade social do município de São Paulo e as internações por diarreia na rede pública com as áreas de inundação na cidade. A partir desses dados, a pesquisadora Doris Jimena Roncancio Benitez desenvolveu mapas que mostram como essas informações estão apresentadas na capital paulista.

A pesquisadora destaca que existe toda uma justificativa por trás do objetivo da pesquisa: as consequências das mudanças climáticas. “Segundo as modelagens climáticas, os eventos de precipitação chamados de extremos vão ser cada vez mais frequentes na cidade. Esse tema sempre tem muito eco na mídia, desde a visão dos danos diretos que podem ser causados ao meio ambiente, às nossas cidades e lares, até a perspectiva da saúde. As mudanças no meio ambiente podem trazer consequências sobre nós que também deveríamos conhecer para agirmos adequadamente”, aponta.

O estudo mostrou que as taxas mais altas de internação por diarreia no Sistema Único de Saúde (SUS) na cidade de São Paulo coincidem com as áreas mais vulneráveis do município: as periferias das regiões leste e sul. Já nas áreas centrais, a taxa de vulnerabilidade é baixa. Entretanto, quase 60% do mapa foi considerado com vulnerabilidade média. “Entre esses extremos, há pontos mistos, com taxas altas e baixas, muito próximos uns aos outros. Nesses locais, a vulnerabilidade é média e é muito fragmentada. O poder público precisa estar atento a isso”, alerta a pesquisadora.

Doris Jimena conta que não houve uma diferença muito grande na comparação entre as épocas de chuva (outubro a abril) e as de seca (maio e setembro). “Então essa vulnerabilidade ocorre o ano todo. Portanto, se temos locais com vulnerabilidade alta, a situação é ainda pior”, destaca.

“Por isso, as políticas públicas e o direcionamento de recursos precisam ser muito pontuais. É preciso ainda conhecer a cidade mais a fundo, com mais detalhes, principalmente nesta área mista de ocorrência da vulnerabilidade social”

Mapas

O mapa da vulnerabilidade social foi construído segundo um índice desenvolvido a partir de uma metodologia estatística criada na Universidade da Carolina do Sul pela professora Susan Cutter. São levadas em conta variáveis que abrangem desde a situação social da população (renda, média de moradores por casa, nível de educação de chefe do lar, número de crianças, de idosos, etc.) como também as carências sanitárias e a capacidade de suportar uma situação de desastre (conexão à rede de água e elétrica, serviço de coleta de lixo, etc.). Esses dados foram retirados do Censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Doris Jimena explica que, devido à precariedade de informações sobre os locais de inundação no município, foi preciso trabalhar com dados que mostrassem a influência das microbacias hidrográficas da cidade na probabilidade de ocorrência maior ou menor de inundação. “Desde o começo soubemos que ia ser difícil encontrar os locais exatos de inundações na cidade, com datas e áreas inundadas. Por isso, foi preciso trabalhar com as microbacias hidrográficas”, esclarece.

Mapa de vulnerabilidade social (clique para ampliar)

Crédito: Doris Jimena Roncancio Benitez

As taxas de internação por diagnóstico de diarreia do município foram obtidas em uma base de dados disponível no Centro de Estudos da Metrópole (CEM). Doris Jimena considerou a internação de crianças até cinco anos e de idosos acima de 60 anos, mas apenas para o SUS, nos anos de 2009 e 2010. Esses dados possibilitaram construir quatro mapas: dois para idosos (um levando em conta a estação seca, outro, a chuvosa) e dois para crianças (um para a estação seca, outro para a chuvosa). Os resultados da pesquisa foram obtidos a partir da comparação entre o mapa de vulnerabilidade com esses quatro mapas e a análise dos dados.

Ceped

A dissertação de mestrado Vulnerabilidade Social e ocorrência de doenças gastrointestinais associadas com inundações no Município de São Paulo foi realizada sob a orientação da professora Adelaide Cassia Nardocci e apresentada à FSP em maio de 2015.

O estudo está inserido em um projeto de pesquisa realizado no Centro de Estudos e Pesquisas sobre Desastres (Ceped) da USP, um dos Núcleos de Apoio à Pesquisa (NAPs) da Universidade. O Ceped surgiu em 2013 a partir de uma iniciativa conjunta entre a USP e a Defesa Civil do Estado de São Paulo.

Mais informações: email djimenar@usp.br, com Doris Jimena Roncancio Benitez

Queimada de cana-de-açúcar provoca asma em escolares de Campos – Rio de Janeiro

“Populações mais vulneráveis socioeconomicamente estão localizadas em setores censitários que estão sob maior influência dos focos de queimadas e apresentam maior número de escolares com sintomas de asma grave.” O resultado foi extraído da dissertação de mestrado em Saúde Pública e Meio Ambiente pela ENSP da aluna Keila Valente de Souza, que analisou o impacto das queimadas de cana-de-açúcar na prevalência dos sintomas da doença no município de Campos dos Goytacazes (RJ), destacado atualmente pela representativa produção de petróleo. A pesquisa foi realizada sob a orientação do pesquisador Hermano Albuquerque de Castro, atual diretor da ENSP.

A atividade agrícola de cultivo da cana-de-açúcar também apresenta relevância social, ambiental e histórica para o município. Entretanto, observou Keila, as queimadas realizadas no período de sua colheita podem impactar negativamente o meio ambiente e a saúde respiratória da população que reside no município.

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Brasília recebe Seminário de Boas Práticas no Controle da Tuberculose

O II Seminário de Boas Práticas no Controle da Tuberculose e Enfrentamento das Vulnerabilidades e Coinfecções junto a População em Situação de Rua ocorrerá pela segunda vez em Brasília, nesta quarta (18) e quinta-feira (19). O evento tem o objetivo de discutir ações de saúde para a população em situação de rua, tratando de fatores relacionados à saúde e também à assistência social.

De acordo com o Coordenador do Programa Nacional de Controle da Tuberculose no Ministério da Saúde, o médico Draurio Barreira, o seminário será importante para que sejam trabalhadas estratégias de enfretamento da tuberculose em populações mais vulneráveis. “Pessoas em situação de rua, pessoas privadas da sua liberdade, pessoas com HIV e a população indígena têm mais chances de serem infectadas com tuberculose”, explica.

Ainda segundo o coordenador, mais do que qualquer outra doença e agravo na saúde, a tuberculose prevalece nessa população. O seminário será importante para dar visibilidade para a população em situação de rua e divulgar aos gestores as políticas de saúde e assistência social para essa população. Para ele, o seminário terá articulação em diversos setores, como saúde, assistência social, direitos humanos, saúde mental e atenção básica. “Será um meio de articular as práticas e ações voltadas para a população. Esses profissionais de diversos setores estarão em contato e trocarão experiências”, completa Barreira.

O seminário contará com a presença de Coordenadores dos Programas de Tuberculose, Aids, Hepatites, Atenção Básica, Assistência Social, representantes dos Conselhos de estado e capital de saúde e do Movimento Nacional de População em Situação de Rua. Estarão presentes participantes de vários estados, como Ceará, Pernambuco, Goiás, Amapá, Paraná, Rio Grande do Sul, São Paulo, Bahia e Minas Gerais.