Projeto avalia condições ambientais das praias de Niterói, Itaipu e Itacoatiara

Do lixo recolhido nas praias de Itaipu e Itacoatiara em Niterói, a maior parte – pouco mais de 50% – é constituída por várias formas de plástico, desde sacolas a garrafas pet, copos descartáveis e embalagens. No restante, encontram-se materiais diversos, como palitos de picolé e de churrasco, pedaços de vidro, guimbas de cigarro, guardanapos, pedaços de isopor e metais, como tampas de cerveja e pregos, além de restos orgânicos.  Embora o resultado tenha sido observado nas praias oceânicas do município, novos estudos mostram que esse perfil tende a se repetir nas praias do interior da baía de Guanabara e, muito provavelmente, em todo o litoral fluminense. Segundo o biólogo Fábio Vieira de Araújo, da Faculdade de Formação de Professores, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), isso pode ter várias implicações. Levado pelas marés para a água, todo esse plástico se reflete em prejuízo para a vida marinha. “São tartarugas e aves que confundem o brilho do plástico com águas-vivas e peixes, comem e terminam morrendo. E isso significa uma redução da nossa biodiversidade”, comenta o pesquisador, que está desenvolvendo o projeto Praia Limpa é a Minha Praia, com apoio do edital Projetos de Extensão e Pesquisa (ExtPesq), da FAPERJ.

Para ampliar a consciência ambiental da população e divulgar informações sobre formas de preservar o meio ambiente marinho e terrestre, o projeto do pesquisador se divide em três etapas. Na primeira, ele e sua equipe foram a campo e recolheram amostras mensais da água de algumas praias de Niterói e São Gonçalo. “Decidimos nos limitar a esses municípios por serem os mais próximos do nosso campus, em São Gonçalo. Nos últimos três anos, monitoramos, mês a mês, as condições de Gragoatá, Boa Viagem, Flechas, Icaraí, São Francisco, Charitas, Jurujuba, Adão e Eva, Piratininga, Camboinhas, Itacoatiara, Itaipu e outras menos conhecidas, em São Gonçalo”, explica.

A partir da análise dessas 36 amostras, obtidas em cada praia, Vieira de Araújo observou a qualidade da água sob as mais diversas condições ambientais. Comparando com dados anteriores, de final da década de 1980, ele e sua equipe puderam perceber variações em algumas praias. “Em Icaraí, houve uma redução nos níveis de poluição por coliformes termotolerantes na água. Atribuímos essa melhora à entrada em operação de uma estação de tratamento no final da praia. No extremo oposto, praias como Itaipu tiveram valores de coliformes termotolerantes aumentados, muito provavelmente devido ao grande crescimento demográfico da região nessas últimas décadas, sem o devido investimento na infraestrutura de saneamento”, explica.

Os resultados das análises confirmam o que se percebe informalmente: as praias oceânicas, como é o caso de Piratininga, Itacoatiara e Camboinhas, se mantêm sempre abaixo do limite que determina as condições de banho, já que o oceano termina por “lavar” essas águas costeiras. A exceção é Itaipu, cujas águas se misturam às da lagoa do mesmo nome, que chegam contaminadas àquela praia. Já algumas praias que se localizam dentro da baía de Guanabara se mantêm sempre impróprias ao banho, uma vez que sua situação no interior de uma enseada dificulta a renovação de suas águas. É o caso de Flechas e de São Francisco. Outras dependem das condições do tempo. As chuvas, por exemplo, que trazem o lixo das encostas e as águas contaminadas das galerias pluviais, fazem piorar a qualidade dessas águas. Após períodos de estiagem e sol forte, no entanto, a situação melhora, já que os raios solares, sabidamente de efeito bactericida, diminuem a quantidade de micro-organismos na água, melhorando, portanto, sua qualidade ambiental.

Considera-se que águas que em mais de 20% das coletas apresentaram uma contagem de 1.000 coliformes termotolerantes em 100mL são consideradas impróprias ao banho. “Foi o que observamos em Flechas e São Francisco.” Quando entre 10% e 20% das coletas se mostram nessas condições – apesar de consideradas próprias pela legislação vigente –, as águas daquela praia estão no limite. “São aquelas praias em que, após dias de chuva, por exemplo, os valores de coliformes termotolerantes ultrapassam os limites de balneabilidade. É o que acontece em Gragoatá, Boa Viagem, Icaraí e Itaipu”, afirma o pesquisador.

Mas nesses resultados também houve surpresas. Como explica o biólogo, um exemplo disso são as praias de São Gonçalo, no caminho da região dos Lagos, na estrada Niterói–Manilha. Em certas ocasiões, a qualidade das águas mostrou-se melhor do que o esperado, com níveis de coliformes aceitáveis.  “Na ilha de Itaoca, que é um lugar de difícil acesso, as praias são bem agradáveis. Apesar de estarem no fundo da baía de Guanabara, em algumas coletas apresentaram melhor qualidade de água do que, por exemplo, a encontrada em Ipanema e Leblon, nos trechos próximos à saída do canal do Jardim de Alah. Isso evidencia a influência das águas que entram pelo canal naquela região da Zona Sul carioca. Em Itaoca, no entanto, como as águas têm uma tonalidade escura e o fundo de areia fina a torna meio enlameada, suas praias terminam sendo pouco procuradas.”

A partir de 2011, a equipe passou a também fazer coleta de resíduos sólidos nas praias. “Queremos buscar um outro tipo de informação, sobre a qual existem poucos dados, sobretudo no Rio de Janeiro. Além da quantificação total, queremos saber sobre a qualidade desse lixo e as implicações que pode ter sobre águas e areia”, afirma. Foi assim que os pesquisadores procederam a uma separação e constataram que ele é composto em sua maior parte de plástico, proveniente de resíduos deixados pelos próprios frequentadores. “Tudo isso reflete a falta de educação dos banhistas, que nem sempre se preocupam em recolher o próprio lixo, ou que, às vezes, mesmo recolhendo tudo num saco plástico, terminam deixando esse saco na areia”, critica o pesquisador. Como nem sempre há tempo para o recolhimento do lixo pelos garis, muitas vezes a maré acaba levando tudo para a água, especialmente quando os quiosques são na areia – como acontece em Itaipu –, em vez de no calçadão – como em Itacoatiara. “Além dos danos à biota marinha, o resultado de todo este lixo se reflete também em prejuízos à saúde pública e à economia, com aumento dos gastos com limpeza, perdas para o turismo e danos à pesca.”

Isso também motivou os pesquisadores a elaborarem e passarem um questionário sobre o assunto aos frequentadores dessas praias. “Percebemos que, em qualquer uma delas, poucos banhistas associam os restos de comida deixados na areia a prejuízos à saúde. A maioria imagina que, como se trata de restos orgânicos, serão degradados. Mas, antes que isso aconteça, esses restos atrairão vetores de doenças, como ratos, moscas e pombos. Também ainda há muitos que não fazem relação de águas contaminadas com coliformes com a possibilidade de contrair doenças”, conta Araújo.

 

 Divulgação / Uerj
 Alunos da Escola Edem, em Laranjeiras, assistem à
palestra, mostrando como lixo prejudica a vida marinha

Foi aí que o grupo procedeu à segunda etapa do projeto. Sob o lema de que informação nunca é demais, a partir dos resultados obtidos das pesquisas realizadas, a equipe procurou elaborar oficinas, palestras, banners e folders para, em uma terceira etapa, divulgar esses dados em escolas, clubes náuticos, colônias de pescadores e outros grupos.  “Entre pescadores, por exemplo, há muitas reclamações de que suas redes trazem cada vez mais uma quantidade maior de lixo. Nesse sentido, eles querem ver efetivadas medidas dos órgãos públicos, como as secretarias estadual e municipal de Meio Ambiente. Mas muito do lixo marinho também é composto por petrechos de pesca, como pedaços de rede e linhas de pesca, que causam a morte de diversos organismos marinhos que se enroscam neles”, pondera.

Como forma de procurar conscientizar a população, os pesquisadores focam também, e principalmente, nas crianças. “Quando passamos informações às crianças, elas não se cansam de repetir esses novos conhecimentos aos adultos. Várias vezes meus filhos já me perguntaram: ‘Por que aquele moço está jogando lixo no chão? Isso não é errado?!’” É nesse sentido que Araújo e equipe procuram levar exemplares da vida marinha às escolas e a atividades organizadas nas praias. “Tentamos mostrar que esse ambiente é cheio de vida, habitat de uma enorme diversidade de criaturas, desde as mais conhecidas, como peixes, tartarugas e tatuís, a seres bentônicos, que vivem em costões e no fundo, como estrelas do mar, cracas e moluscos.”

Com esse mesmo objetivo, ele escreveu o livro infantil Praia Limpa é a Minha Praia, publicado com apoio do programa de Auxílio à Editoração (APQ 3), que tem sido distribuído em escolas e bibliotecas. “Nossa ideia agora é buscar patrocínio para distribuir mais livros em um maior número de colégios.” Para Araújo, educar sobretudo as novas gerações é fundamental. “Quanto mais os jovens estiverem conscientes de que quanto menos poluírem, mais contribuem para a preservação do ambiente marinho, melhor. Conseguindo diminuir os níveis de poluição, damos um passo importante para a preservação não só do ambiente marinho, mas do meio ambiente como um todo. As futuras gerações certamente só terão a ganhar.”

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