Um estudo desenvolvido na Escola de Enfermagem (EE) da USP abordou o papel das mães no tratamento de hemodiálise dos filhos. Os resultados apontaram que as mães podem apresentar papel mais positivo no tratamento se amparadas psicossocialmente pelos profissionais de saúde.
A dissertação de mestrado da terapeuta ocupacional Fernanda Mieto buscou avaliar qual o sentido que a figura materna dá para a experiência de hemodiálise sofrida pelo filho. Estudos desenvolvidos anteriormente na Alemanha já apontam para uma menor qualidade de vida das famílias com pacientes que fazem o tratamento hemodialítico, quando em comparação a um tratamento a base de medicamentos e ao processo de transplante. Segundo a pesquisadora, a ideia seria trazer essas observações de conflitos e problemas na família para o universo materno. “Muitas pesquisas investigavam a vivência da criança e do adolescente com insuficiência renal crônica, mas nenhuma tratava diretamente da experiência do tratamento, sobretudo com enfoque nas mães”.
A insuficiência renal crônica é uma lesão nos rins, os quais apresentam uma perda progressiva das suas funções. “Em um tratamento conservador, são utilizadas apenas a medicação e uma dieta rigorosa. Quando o paciente apresenta menos de 10% da função renal, utiliza-se tratamentos dialíticos, como a hemodiálise, e a pessoa também busca o transplante”. No caso da hemodiálise, a pessoa é tratada em uma unidade hospitalar de três a cinco vezes por semana, por um período de 4 horas por dia.
A pesquisa se baseou na teoria fundamentada em dados. Inicialmente as mães respondiam a uma pergunta aberta sobre a experiência de acompanhar o filho na hemodiálise. “A partir das respostas, abordávamos outros pontos e desenvolvíamos outras perguntas para complementar o relato”.
Ao todo, 11 mulheres participaram do projeto, sendo as sete primeiras selecionadas apenas pelo critério de que o filho realizava tratamento hemodialítico. Entre as demais mães, duas vivenciavam o início do tratamento e outras duas tinham filhos na fila de espera do transplante. “A função dos dois últimos grupos era permitir a observação do impacto inicial do tratamento e a possível mudança de perspectivas uma vez estando na fila do transplante”.
Fernanda conta que o primeiro grupo de mulheres disseram enxergar na máquina de hemodiálise um objeto de extrema ameaça, que poderia levar o filho à morte. “O receio da máquina é tamanho que muitas delas negam a necessidade do tratamento. Esse ponto inclusive também pode ser observado no segundo grupo, com o impacto inicial”, afirma.
O projeto observou também o grau de dependência criada pela máquina hemodialítica tanto nas crianças e adolescentes, quanto nas mães, e avaliou a influência do transplante na mudança dessa perspectiva. Fernanda cita que a vida das mães também estava fortemente presa à máquina, e que eram recorrentes os relatos de que a cirurgia de transplante poderia possibilitar a liberdade da vida delas. “Muitas mães abdicam do trabalhos, deixam de buscar o lazer e acabam criando um isolamento social. Isso deixa a criança ainda mais vulnerável a transtornos emocionais”.
Posturas profissionais
A pesquisadora ressalta que o intuito do estudo é criar a base inicial para futuros projetos de orientação das equipes médicas no amparo às mães. “A ideia é sempre manter um canal de escuta para as mães. O profissional da saúde deve buscar a compreensão da dimensão do sofrimento para que possa auxiliar o acompanhante do paciente”.
Ela conta que, segundo o censo de diálise, atualmente em São Paulo existem 2.010 pacientes de 1 a 12 anos e 577 pacientes de 13 a 18 anos que estão em tratamento dialítico. Devido ao elevado número, Fernanda ressalta que somente na interação social é possível estabelecer um novo significado e obter um novo comportamento das mães frente ao tratamento. “Muitas abandonam o tratamento devido a falta de orientações mais assertivas, que só poderiam ser elaboradas a partir dessa compreensão de como elas encaram essa experiência”.
Foto: Marcos Santos/USP Imagens