Ocorrência do plágio põe em alerta comunidade científica

Ela ainda revelou que a identificação de má conduta, dentre elas a ocorrência de plágio, triplicou ao se considerar as décadas de 1970 a 2007, tendo passado de menos de 0,25% para 1% em estudos submetidos ao Medline.

Apesar de parecer simples, a definição do plágio abre margem para a discussão de inúmeras questões. Uma delas é o ‘plágio inteligente’. Sônia citou um artigo da revista Nature, no qual, apesar de não haver um conceito claro, o fato se configura quando há utilização de trabalhos anteriores para gerar artigos novos, com dados inéditos. "O plágio inteligente é bastante problemático e perigoso. Normalmente, durante a revisão do artigo, são identificados trechos que se parecem com algum trabalho anterior, mas ao mesmo tempo a publicação parece trazer dados novos. Fica a dúvida se essa contribuição é original ou não para a ciência", questionou.

No contexto internacional do plágio, de acordo com Sônia, qualquer empréstimo feito de outra publicação deve ser marcado entre aspas. Entretanto, no meio científico, há pesquisadores que dão importância somente aos dados, deixando o texto e a sua interpretação em segundo plano. "Nesses casos, ocorre justamente o inesperado. As palavras de um artigo, principalmente para quem não é de um país anglofônico, possuem extrema importância. Se o autor não souber discutir um pequeno trecho em inglês em determinado texto, acaba achando um pronto em outro artigo. Como justificativa, aquele que copiou, em geral, alega que modificar o que está escrito deturpa o que está na literatura. Esse é um sentimento natural daqueles que não dominam o idioma."

Autoplágio pode ser configurado com a reutilização de 30% daquilo que já foi publicado pelo próprio autor

A respeito das diferentes interpretações em relação ao plágio, a pesquisadora da UFRJ citou novamente um artigo da Nature. Publicado por cientistas turcos, o texto afirma que "pegar emprestado frases de um paper que simplesmente ajude a introduzir o problema não deve ser visto como plágio", e continua: "Mesmo se a introdução não for completamente original, os dados são. Eles são a peça mais importante de um artigo científico. Nesse clima de publique ou pereça, estamos sob pressão para publicar resultados". Sônia analisou o caso da seguinte forma: "O título da matéria diz que eles não estão plagiando, que ‘pegam emprestado’ um inglês melhor. Mas não se trata de um caso único. Em alguns lugares, pesquisadores cometem plágio justamente por não saberem que é ilegítimo. Há uma questão cultural nesse aspecto também.

Ao comentar o papel dos revisores na identificação do autoplágio, Sônia afirmou que há um grande conflito nessa definição. Apesar do pouco consenso em relação ao quanto de ‘empréstimo’ um autor pode pegar de seus próprios textos, há editores que consideram razoável reutilizar 30% daquilo que já foi publicado. "Essa questão é bastante controversa, pois, em muitos casos, 30% podem representar praticamente a contribuição inteira de um novo trabalho. Os autores, por sua vez, questionam a impossibilidade de reutilizarem suas próprias palavras"

" Quando se está atento para o erro, ele é percebido com mais facilidade"

No Brasil, segundo a exposição da palestrante, "alguns casos de empréstimos textuais têm sido interpretados como problemas editoriais, ao invés de plágio acadêmico". A condição privilegiada do país em relação à produção científica na América Latina e a discussão sobre a integridade em pesquisa fez com que a Ordem dos Advogados do Brasil expedisse, em 2010, um documento que expressava a preocupação com o plágio na academia e cobrava uma posição das instituições brasileiras em relação à prática.

Aos alunos da pós-graduação da ENSP, deixou uma mensagem: "No contexto atual, a metodologia de trabalho requer bastante atenção. O aluno deve ter cuidado ao inserir um procedimento de trabalho como se fosse seu, mas não é. Esse momento em que vocês estão ingressando na pós é muito singular e, seguramente, seus orientadores não passaram por isso. As demandas de confiabilidade não mudaram, mas a forma de lidar com as demandas e a fiscalização mudaram bastante. Quando se está atento para o erro, ele é percebido com mais facilidade. Essa cultura está sendo internalizada nas instituições, e vocês devem ter mais cuidado". 

A mesa de abertura contou com a participação da vice-diretora de Pós-Graduação, Maria Helena Mendonça, e dos coordenadores dos quatro Programas de Pós-Graduação da ENSP: Cristina Guilam, Saúde Pública; Sergio Koifman, Saúde Pública e Meio Ambiente; Ana Glória Godoi Vasconcelos, coordenadora adjunta de Epidemiologia em Saúde Pública; e Sergio Rego, de Bioética, Ética Aplicada e Saúde Coletiva. Na primeira parte do evento, os alunos receberam informações sobre a segurança no campus da Fiocruz, o serviço de gestão acadêmica, a biblioteca e o comitê de ética da ENSP.

A edição de sexta-feira (18/3) do Informe ENSP publicará uma entrevista exclusiva com Sonia Vasconcelos sobre o plágio na comunidade científica.

Aula inaugural será dia 11 de abril

Este ano, a aula inaugural da ENSP será realizada no dia 11 de abril no Seminário Internacional Acesso livre ao conhecimento, promovido pela ENSP em parceria com a UNA-SUS. A palestra de abertura do evento será proferida pelo Dr. Eloy António Santos Cordeiro Rodrigues, diretor da Universidade do Minho, em Braga, Portugal

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

For security, use of Google's reCAPTCHA service is required which is subject to the Google Privacy Policy and Terms of Use.