Mutação genética pode explicar tumor da suprarrenal

Equipe de pesquisadores da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP, liderados pelo professor Sonir Antonini, do departamento de Puericultura e Pediatria, conseguiu identificar problemas em vias de sinalização celular envolvidas no desencadeamento de uma doença que acomete 15 vezes mais crianças e adolescentes brasileiros que os do resto do mundo, o tumor da suprarrenal. O trabalho dos pesquisadores liderados pelo professor Antonini recebeu no último mês de novembro o Prêmio Saúde 2014, na Área de Saúde da Criança, conferido pela Editora Abril.

As glândulas suprarrenais (ou adrenais) estão localizadas próximas à parte superior dos rins. Elas são formadas por dois compartimentos: a medula, que secreta adrenalina e noradrenalina, e o córtex, que produz hormônios esteroides. Entre estes hormônios estão o cortisol e aldosterona, ambos imprescindíveis à vida. Além disso, durante a vida fetal e a partir da puberdade, o córtex suprarrenal secreta também hormônios androgênicos.

Os trabalhos foram desenvolvidos no Laboratório de Endocrinologia Molecular do Hospital das Clínicas da FMRP (HCFMRP) em conjunto com especialistas do Centro Infantil Boldrini, de Campinas, e da Faculdade de Medicina (FM) da USP. Estudando pacientes das três instituições — foram 62 crianças e 15 adultos —, demonstraram que “anormalidades da via de sinalização celular Wnt/beta-catenina são muito importantes na gênese destes tumores em pacientes pediátricos”. Essa via de sinalização — a via Wnt/beta-catenina —, garante Antonini, “é uma via muito importante na maior parte das células do organismo e está envolvida no processo de formação de órgão e tecidos, bem como na sua manutenção”.

Também é creditado à equipe ter demonstrado pela primeira vez na literatura científica internacional, em 2014, a importância de outra via importante no ambiente intracelular, a via Sonic Hedgehog (SHH), para as glândulas suprrarenais humanas. Segundo o professor Antonini, essa sinalização e sua consequente ativação são importantes no desenvolvimento normal das suprarrenais. Porém a maioria dos tumores suprarrenais estudados apresentava sinais de desregulação desta via. “Durante o desenvolvimento fetal e o pós-natal, a sinalização feita pela via SHH na suprarrenal parece ser fundamental para a diferenciação dos diversos tipos celulares que compõem a córtex da suprarrenal, cada um secretando um tipo de hormônio”.

Mecanismos celulares
Os primeiros relatos clínicos sobre a doença foram publicados por professores da FMRP e da FMUSP, em revistas científicas nacionais. Atualmente, a equipe liderada pelo professor Antonini estuda mecanismos celulares in vitro (no laboratório), testando substâncias e tecnologias que atuam nessas vias de sinalização e sejam capazes de reduzir o crescimento de células tumorais. Se forem confirmados os achados iniciais dos estudos, acredita o professor, “a manipulação destas vias poderá ajudar a reduzir a secreção hormonal excessiva, encontrada na maioria dos tumores a ainda ajudar a eliminar células tumorais”.

Além do potencial de terapias que essas descobertas podem trazer, o grupo também busca novos defeitos genéticos responsáveis pelo desenvolvimento e progressão desses tumores. “O objetivo é avançar no entendimento desta doença importante no Brasil e melhorar a vida das crianças e adolescentes afetadas”, acrescenta o professor.

O professor Antonini afirma que crianças e adolescentes brasileiros têm de 10 a 15 vezes mais chance de desenvolver tumor nas glândulas suprarrenais em função de predisposição genética, e a mutação é frequente em brasileiros, principalmente nas regiões Sul e Sudeste do País. Antonini acrescenta que existe uma questão ainda a ser respondida pela ciência: se existem e quais são os fatores que determinam quais pessoas que carregam a mutação no gene TP53 irão desenvolver o tumor.

Hoje, a cirurgia é o único tratamento efetivo para a doença, além de ser sempre o primeiro passo no tratamento. Quando a doença é detectada em estágios iniciais (estágios I e II), a chance do paciente estar vivo após cinco anos é de 70% a 95% em crianças e adolescentes. Em adultos, esta chance é significativamente menor. No entanto, nos estágios mais avançados (III e IV) ou quando a cirurgia não consegue exterminar completamente o tumor, os únicos tratamentos disponíveis — quimioterápicos — são tóxicos e pouco eficientes. Além disso, “este tumor não responde ao tratamento com radioterapia”.

Recentemente, o conjunto de pesquisas lideradas pelo professor Antonini foi vencedor da Nona Edição do Prêmio Saúde 2014 – Área de Saúde da Criança, conferido pela Editora Abril. Os vencedores das oito categorias, eleitos por júri técnico nacional entre os 427 trabalhos inscritos, foram anunciados em cerimônia realizada em São Paulo em novembro passado.