A previsão é de que, a partir de 2024, todos os estados do país estejam realizando o diagnóstico (foto: Eduardo Gomes)
Desenvolvido no Instituto Leônidas & Maria Deane (Fiocruz Amazônia), o protocolo de diagnóstico por PCR em tempo real para a detecção do Oropouche será utilizado por oito laboratórios públicos brasileiros e, futuramente, em outros países da América. O Oropouche é um arbovírus que causa sintomas parecidos com a dengue e a decisão de uso do protocolo foi tomada pela Coordenação Geral de Laboratório de Saúde Pública (CGLAB) do Ministério da Saúde (MS), como parte da estratégia de vigilância de vírus emergentes no continente. A adoção do ensaio visa ampliar a oferta diagnóstica para a prevenção do surgimento de doenças com potencial para se transformar em epidemias ou pandemias.
De acordo com o CGLAB/MS, no Brasil, os laboratórios dos Estados foram selecionados conforme o cenário epidemiológico. A previsão é de que, a partir de 2024, todos os estados do país estejam realizando o diagnóstico. Os oito laboratórios são os Laboratórios Centrais de Saúde Pública (Lacens) do Acre (AC), Amazonas (AM), Distrito Federal (DF), Goiás (GO), Maranhão (MA), Pará (PA), Rondônia (RO) e Roraima (RR). O vírus Oropouche é transmitido pela picada do Culicoides paraenses, popularmente conhecido como maruim. Os mosquitos do gênero Culex podem ser vetores secundários.
Segundo o virologista Felipe Naveca, chefe do Laboratório de Arbovírus e Vírus Hemorrágico no Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) e coordenador do Núcleo de Vigilância de Vírus Emergentes, Reemergentes ou Negligenciados da Fiocruz Amazônia, o Oropouche foi encontrado em quatro estados da região Norte em 2023 e pode se tornar, a qualquer momento, um problema mais sério de Saúde Pública. “Estamos vigilantes em relação aos novos casos e contamos atualmente com o apoio dos laboratórios centrais de referência estaduais habilitados a fazer a identificação, via PCR em tempo real, nos estados do Amazonas, Rondônia, Roraima e Acre, onde foram registrados casos esse ano”, explica Naveca, que também integra a Rede Genômica da Fiocruz.
Os primeiros registros do atual surto de Oropouche no Brasil foram feitos no final de 2022 pelo Laboratório Central de Roraima. Na sequência, vieram os estados do Amazonas, Rondônia e Acre. “Para se ter uma ideia, em Roraima, temos mais casos confirmados para Oropouche do que para dengue este ano”, afirma o virologista. Naveca ressalta que o Oropouche causa um quadro clínico muito parecido com o da dengue. “Clinicamente, é muito difícil de se diferenciar de um quadro de dengue, para isso necessita de um exame laboratorial”, observa. Ele acrescenta que 95% dos casos confirmados este ano no Brasil foram diagnosticados via PCR em tempo real, utilizando o protocolo desenvolvido na Fiocruz Amazônia. “Por meio do nosso trabalho de caracterização genética, utilizando ferramentas de vigilância genômica, foi possível demonstrar que todos esses casos do surto 2022-2023 são de uma mesma linhagem do vírus Oropouche que está circulando em pelo menos 18 municípios dos quatro estados, para os quais nós tivemos amostras investigadas”, afirmou.
Oropouche nas Américas
A experiência com o atual surto causado pelo vírus Oropouche no Brasil, assim como a estratégia de diagnóstico e o protocolo para sequenciamento genético (parte da estratégia de Vigilância Genômica) foram apresentados por Felipe Naveca em dois painéis durante a 14ª Reunião da Rede de Laboratórios de Arboviroses das Américas (Relda), que ocorreu em agosto na cidade de Santo Domingo, na República Dominicana. Promovida pela Organização Pan-Americana da Saúde (Opas/OMS), a Relda tem como objetivo fortalecer a rede de vigilância molecular e os programas de controle de enfermidades na região das Américas. O evento contou com a participação de diversos países, como Argentina, Estados Unidos, Cuba, México, Haiti, Costa Rica, Suriname e Bolívia.
Apresentações serviram de alerta para os demais países da América que provavelmente já devem ter a circulação de Oropouche sem um diagnóstico preciso (foto: Fiocruz Amazônia)
O evento, segundo o virologista, foi uma oportunidade de expor os dados resultantes do trabalho desenvolvido pela Fiocruz e pelos laboratórios de saúde pública do Brasil. Para Naveca, a oportunidade também serviu de alerta para os demais países da América que provavelmente já devem ter a circulação de Oropouche, sem um diagnóstico preciso. “Iremos ajudar na implementação desse ensaio em todos os países que tiverem interesse”, afirmou.
Dengue
Sobre a situação da vigilância genômica da dengue no Brasil, Naveca destacou que o cenário é bastante heterogêneo. “Temos estados onde predomina a dengue 2 e, em outros, a dengue 1. Porém, a troca para um novo genótipo recente encontrado no Brasil, que se chama cosmopolita, está tornando a dengue 2 o principal sorotipo em alguns locais”, afirmou.
No caso do Amazonas, houve uma mudança de cenário nos últimos anos, sendo atualmente a dengue 2, genótipo cosmopolita, predominante. “Destacamos também que os estudos que fizemos em colaboração com pesquisadores da Fiocruz e de outras instituições demonstram que esse genótipo da dengue 2 entrou pelo menos quatro vezes no país e já está em todas as regiões. Outro destaque é a reemergência da dengue 3, detectada pelo Lacen/Roraima, onde trabalhamos em conjunto na caracterização de uma nova linhagem nas Américas”, observou.