Fiocruz leva experiência brasileira com o Aedes aos EUA

Um encontro promovido pelo Centro para Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC, na sigla em inglês) reuniu, na sede do Instituto, em Atlanta, um seleto grupo de pesquisadores e representantes do poder público e da indústria em busca de estratégias para controle do Aedes aegypti em territórios norte-americanos. Única representante brasileira na reunião, a pesquisadora do Laboratório de Biologia Molecular de Flavivírus do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), Denise Valle, teve a missão de apresentar algumas das abordagens adotadas no Brasil.

O encontro, denominado Estratégias para Controle Vetorial de Aedes aegypti e as Doenças Transmitidas por ele: traçando o caminho a seguir, realizado na última semana de fevereiro, foi uma preparação do CDC para a aproximação de estações mais quentes no hemisfério norte, que favorecem a proliferação de mosquitos. Segundo dados da instituição, mais de 42 mil pessoas nos Estados Unidos e seus territórios já foram infectados pelo vírus zika, sendo que 4.6 mil gestantes tiveram confirmação laboratorial da infecção.

“Diferentemente do Brasil, um país tropical, os Estados Unidos não tinham um histórico de doenças transmitidas por mosquitos, principalmente pelo Aedes. No entanto, o vírus zika conseguiu se espalhar com razoável facilidade por lá e outros 60 países. Isso elevou os níveis de alerta do CDC, o maior centro de pesquisas do mundo. Os americanos estão procurando se antecipar a novos surtos e epidemias, a partir do desenvolvimento de estratégias para controle do Aedes e, assim, evitar que o zika e outras doenças se espalhem pelos territórios norte-americanos. Todos os países, incluindo o Brasil, precisam estar sempre atentos para a possibilidade de emergência e reemergência de patógenos causadores de doenças”, pontuou Denise Valle, que trabalha há quase duas décadas com métodos de vigilância e controle de Aedes.

Durante a mesa Desafios para a Implementação de Estratégias de Controle, Denise, que por 13 anos atuou na coordenação da Rede Nacional de Monitoramento da Resistência de Aedes aegypti a Inseticidas (MoReNAa) junto ao Ministério da Saúde, apresentou um panorama histórico do controle químico do vetor no país e explicou os desafios do uso indiscriminado de inseticidas. A bióloga, que é uma das organizadoras de um premiado livro sobre a dengue – Dengue: teorias e práticas, publicado pela Editora Fiocruz –, também abordou a importância do engajamento da população e dos veículos de comunicação no combate ao mosquito. “Desde 2009, desenvolvemos no IOC, de forma sistemática, métodos para disseminação de informações corretas sobre o Aedes por meio de oficinas com agentes multiplicadores da informação. Já tivemos a oportunidade de engajar centenas de jornalistas, escoteiros, professores, estudantes e militares”, comemorou Denise. “Os especialistas presentes no encontro realizado no CDC comentaram bastante essa abordagem, que utiliza a conscientização, não armas químicas”, completou.

A iniciativa 10 minutos contra o Aedes, idealizada por Denise e outros pesquisadores e profissionais de comunicação do IOC, também foi alvo de interesse no evento. De acordo com o conceito, uma vistoria semanal de 10 minutos é suficiente para eliminação de possíveis criadouros do Aedes aegypti. “A intervenção periódica é suficiente para interromper o ciclo de vida do mosquito, que leva de 7 a 10 dias para se desenvolver do ovo até a forma adulta”, explicou. Inspirado em uma ação governamental de sucesso realizada em Cingapura, o conceito dos ‘10 minutos’, lançado em 2011, está amplamente difundido pelo Brasil. No Rio de Janeiro, por exemplo, no ano seguinte à implementação do conceito como campanha oficial pela Secretaria de Estado de Saúde, aumentou em três vezes o número de municípios com índices toleráveis de infestação pelo Aedes.

Outra iniciativa apresentada foi o projeto de videoaulas Aedes aegypti: Introdução aos Aspectos Científicos do Vetor, que disponibiliza gratuitamente na internet aulas sobre diversos aspectos do vetor dos vírus dengue, zika e chikungunya. Desde o lançamento, em 2013, foram mais de 200 mil visualizações no YouTube, oriundas de 107 países. No Brasil, secretarias de educação em dez Estados atuaram como parceiras por meio da distribuição de cartazes nas escolas e do envio de material de divulgação aos professores. A parceria alcançou cerca de 14 mil escolas, distribuídas nas cinco regiões do país. O projeto também recebeu a adesão espontânea de diversas prefeituras, além de profissionais das áreas da Saúde e Educação.

Mosquitos com bactéria que inibe a transmissão dos vírus, Aedes geneticamente modificados, desenvolvimento de novos inseticidas, repelentes e armadilhas de captura de insetos para estudos científicos, além de implementação de métodos capazes de mensurar impactos entomológicos e epidemiológicos também estiveram entre os tópicos debatidos no encontro. “A solução para o controle do Aedes e as doenças transmitidas por ele não é missão exclusiva da área da Saúde e não depende apenas de ferramentas técnicas. É necessário agir com base em intersetorialidade e valorizar a interação direta com a população. Além disso, é fundamental ter responsabilidade social, tanto no âmbito privado, no sentido de manutenção dos espaços domésticos, sem água acumulada que possa se tornar um criadouro, quanto na esfera pública, com ações que garantam a limpeza dos espaços comuns, além de acesso da população ao saneamento básico e fornecimento regular de água”, finalizou.