Embalagens podem comunicar alimentação saudável

Em todo o mundo, os consumidores não conseguem optar por uma alimentação saudável devido a falta de entendimento da informação contida nas embalagens, escrita em linguagem técnica. Segundo pesquisa realizada na Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP pela jornalista Francine Lima, as informações nutricionais obrigatórias sobre os produtos ficam em segundo plano diante da mensagem publicitária da marca. A pesquisadora sugere a realização de estudos interdisciplinares para tornar as embalagens mais compreensíveis ao público em geral.

Francine, que é criadora do canal de vídeos “Do campo à mesa”, mergulhou em uma pesquisa qualitativa que culminou na dissertação de mestrado, Comunicação na promoção da alimentação saudável via rótulos: uma análise dos discursos, defendida no fim de agosto de 2014, na FSP. O objetivo era verificar até que ponto os rótulos dos alimentos comunicam o que é necessário comunicar para funcionar como instrumentos de promoção da alimentação saudável e se eles estão realmente aptos a ajudar as pessoas a escolher os alimentos mais adequados.

Em sua revisão bibliográfica, a jornalista observou que consumidores em diversos países não conseguem aproveitar direito a informação nos rótulos devido à linguagem excessivamente técnica. Já o uso de elementos visuais e verbais com apelo emocional, que facilitam a comunicação com os consumidores, ainda não foi suficientemente estudado. Francine aponta que novos estudos interdisciplinares focados na comunicabilidade dos rótulos ajudarão a torná-los mais compreensíveis e úteis aos consumidores.

Com uma análise empírica de embalagens de “cereais matinais”, o trabalho também mostrou que as informações obrigatórias nos rótulos, tais como a tabela nutricional e a lista de ingredientes, são exibidas de forma não competitiva em relação à mensagem publicitária da marca, favorecida pelo design. Assim, o que o consumidor mais precisa saber sobre os alimentos fica relegado a segundo plano, em benefício do marketing.

Guia Alimentar
Além disso, o conceito de alimentação saudável comunicado pelas marcas, por meio de imagens, figuras, gráficos e textos tende a não corresponder àquele adotado no texto da Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN) e descrito no novo Guia Alimentar para a População Brasileira, lançado oficialmente em 4 de novembro. Criado por pesquisadores da FSP em conjunto com o Ministério da Saúde, o novo guia enfatiza que uma alimentação saudável deve ser pensada em termos de alimentos, e não de nutrientes. Mas os rótulos descrevem os alimentos com base em seus nutrientes, deixando de lado aspectos que o novo guia considera mais importantes, tais como os ingredientes, o grau de processamento e o modo de comer.

Assim, enquanto o Ministério da Saúde se esforça em recomendar que as pessoas consumam mais alimentos integrais em refeições conectadas com a cultura do que de produtos ultraprocessados inteiramente criados pela indústria, os rótulos ainda enaltecem produtos de baixo valor nutricional, vendidos como se fossem verdadeiramente nutritivos. Dentre as propostas que o trabalho de Francine traz para a rotulagem está a ideia de apresentar os ingredientes na embalagem com mais destaque e separados em quatro grupos: alimentos, ingredientes culinários, ingredientes industriais e aditivos. Isso tornaria a comparação entre produtos de uma mesma categoria mais realista. Ela sugere ainda que números sejam substituídos por representações gráficas e que os impactos socioambientais apareçam integrados aos impactos nutricionais.

Para Francine, os rótulos poderão se tornar um instrumento efetivo de promoção da alimentação saudável se passarem a falar a mesma língua do novo guia alimentar. “Os rótulos serão mais úteis e honestos quando informarem com clareza e ênfase o teor de alimento nos produtos. Isso é muito mais importante que a quantidade de calorias ou de vitaminas adicionadas”, conclui.

O trabalho da aluna foi orientado pelo professor Carlos Augusto Monteiro, da FSP, e líder da equipe que elaborou o novo guia alimentar. Participaram da banca a professora Patrícia Constante Jaime, que atualmente é coordenadora-geral da Coordenação Geral de Alimentação e Nutrição (CGAN), no Ministério da Saúde, e professor Eneus Batista Trindade, da Escola de Comunicações e Artes da USP.

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