Enquanto as tendências do mundo fitness mudam com frequência – e certas modalidades, técnicas e suplementos perdem o apelo em pouco tempo -, a creatina é uma das substâncias que permanecem firmemente recomendadas por profissionais de saúde devido aos seus benefícios amplamente estudados.
A creatina é naturalmente produzida pelo corpo humano por meio de 3 aminoácidos (lisina, metionina, arginina) no fígado, rim e pâncreas – e a substância também chega em nosso organismo por meio de alimentos de origem animal, como carnes e leite.
Uma parte da substância é excretada pela urina, e cerca de 60% a 80% é armazenado pelo organismo.
“Ao usar a creatina na forma suplementar, esses estoques são preenchidos, o que ajuda na melhora do desempenho e força na realização de exercício físicos”, explica Felipe Henning Gaia Duarte, presidente da SBEM-SP (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia – Regional São Paulo).
Quais os benefícios da creatina?
A creatina aprimora a disponibilidade de energia necessária para manter a contração muscular durante atividades físicas exigentes.
Isso resulta em melhor desempenho físico, aumento da capacidade para realizar exercícios de resistência, aceleração da recuperação entre séries e contribuição para o desenvolvimento de força e massa muscular.
A função primordial da creatina é sua conversão em fosfocreatina nas fibras musculares. A fosfocreatina atua como uma reserva imediata de energia, fornecendo grupos de fosfato que desempenham um papel chave na rápida regeneração do ATP, a principal fonte de energia nas atividades celulares.
“Isso aumenta a capacidade de trabalho durante exercícios intensos, permitindo adiar a fadiga, o que se traduz em realizar mais repetições de exercícios ou séries com maior intensidade, fundamental para o ganho de massa muscular e força”, descreve Fabrício Buzatto, médico do esporte e membro da SBMEE (Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e do Esporte).
O suplemento também aprimora a recuperação entre séries, permitindo treinar com maior intensidade e frequência, o que é essencial para o crescimento muscular.
A necessidade de manter uma boa quantidade de massa muscular é essencial para a saúde e o bem-estar – e vai muito além da aparência física e do desempenho esportivo.
Ela ajuda a controlar o peso, prevenir lesões, fortalecer ossos, regular os níveis de glicose e melhorar a saúde cardíaca. Além disso, contribui para o envelhecimento saudável, promove a função metabólica adequada [o equilíbrio saudável entre a energia que entra e sai, evitando problemas como obesidade ou desequilíbrios hormonais].
A creatina também pode atrair água para as células musculares, resultando em um ligeiro inchaço celular. É importante notar que esse aumento na retenção de água ocorre no interior das células musculares, não no tecido adiposo, portanto, a creatina não causa ganho de peso na forma de gordura.
Um estudo publicado no periódico científico Medicine & Science in Sports & Exercise demonstrou os resultados do uso de creatina comparando um grupo que recebeu a suplementação com outro que recebeu uma substância placebo.
Após um período de 12 semanas, observou-se um aumento significativo na massa muscular e ganhos de força (medida pela carga dos exercícios supino, para peitoral, e agachamento, para membros inferiores).
Alguns estudos sugerem ainda que a creatina pode ter benefícios para a função cerebral, ajudando a melhorar a cognição em situações de estresse, mas não existem comprovações que confirmem sua eficácia nesta aplicação específica.
Para quem a suplementação de creatina é indicada?
Alguns grupos específicos podem se beneficiar, como atletas de alto desempenho, pessoas que precisam ganhar massa muscular (incluindo idosos) e quem segue dietas específicas. No entanto, é sempre necessário consultar um profissional da saúde
A creatina monoidratada é a forma mais comum e eficaz de suplemento.
“A suplementação é particularmente interessante para vegetarianos e veganos, pois a creatina é encontrada principalmente em carnes e alimentos de origem animal”, aponta Buzzato.
A creatina é produzida sinteticamente em laboratórios. Substâncias como sarcosinato e cianamida sofrem reações químicas controladas que dão origem à molécula de creatina.
Após as reações químicas, o produto final é submetido a procedimentos de purificação, destinados a eliminar subprodutos indesejados. Por fim, a creatina purificada é convertida em um pó seco por meio de um processo de secagem.
Quanto às contraindicações, o médico afirma que a creatina é geralmente segura, com algumas restrições para pacientes com comprometimento renal.
“Para aqueles com problemas hepáticos, a creatina pode ser usada com precaução, monitorando a função renal e hepática e sempre com acompanhamento médico.”
Se o objetivo é a melhora da performance, os médicos advertem que a creatina – sem a prática de exercício físico – não tem efeito.
“Mesmo para quem recebe o diagnóstico de osteopenia [perda gradual de massa óssea] e faz a suplementação com creatina, mas não pratica exercício físico, a creatina não vai ter nenhuma função, nem na massa muscular e nem na saúde”, aponta Duarte, presidente da SBEM-SP.
O mesmo vale para quem sofre de sarcopenia, a perda de massa e força na musculatura esquelética.
Nesses casos, o principal tratamento seria a prática de atividades físicas para fortalecer o corpo e uma dieta nutricionalmente rica – a creatina entraria apenas como uma ajuda extra para a construção de massa muscular.
Em relação à dosagem, Fabrício Buzzato aponta que a prescrição pode variar a depender das características de cada pessoa, mas geralmente fica entre 3 a 5 gramas por dia.
Seguindo a ingestão recomendada, o formato – cápsula ou pó – depende da escolha de cada um. As cápsulas podem ser uma alternativa mais prática, mas sua absorção é um pouco mais lenta, já que precisa se dissolver no estômago antes que o conteúdo seja absorvido.
“Não é necessário exagerar na ingestão e não é preciso fazer ciclos de uso – o recomendado é usar continuamente conforme orientação médica”, diz o médico.
Há especialistas que advertem que o consumo em excesso, considerado como acima de 30 gramas por dia, a longo prazo, poderia resultar em disfunções hepáticas e renais, além de possíveis alterações no ritmo cardíaco. No entanto, evidências científicas sobre esse aspecto são escassas e não fornecem uma conclusão definitiva.
Quanto à qualidade do produto, Buzatto adverte é essencial escolher marcas e laboratórios respeitáveis, com boas reputações e testes de pureza.
De acordo com a regulamentação da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), uma dose do suplemento deve fornecer de 1,5 gramas a 3 gramas de creatina.
Por que tomar creatina se ela é produzida naturalmente pelo organismo?
Ao contrário de alguns suplementos, como a vitamina C, em que não há necessidade de suplementação para a maioria das pessoas que tem uma dieta saudável, a creatina é um caso especial.
“Para obter a quantidade recomendada de cinco gramas de creatina, você teria que consumir uma grande quantidade de carne [e ainda maior de outros alimentos, como leite]. A disponibilidade natural da creatina na natureza é limitada, o que torna a suplementação uma escolha sensata.”
Segundo Duarte, ao contrário de outros suplementos, a creatina tem uma ação contínua, então não há uma recomendação específica sobre consumi-la antes ou depois do treino.
“O importante é tomar junto com alimentos que sejam fontes de carboidrato e de proteína, porque assim será mais retida pelo músculo.”