Medicamento se mostrou mais eficiente que estimulação transcraniana, que só deve ser usada em casos específicos
A comparação entre dois tratamentos para sintomas de depressão é tema de pesquisa descrita em artigo da revista científica New England Journal of Medicine. O estudo do médico e pesquisador André Brunoni analisou a técnica de estimulação transcraniana por corrente contínua (ETCC) e a terapia com o medicamento escitalopram. Os resultados mostram que o fármaco teve maior eficácia para reduzir a gravidade da depressão, sendo o mais indicado para o tratamento.
A pesquisa do Hospital Universitário (HU) da USP e do Instituto de Psiquiatria (IPq) do Hospital das Clínicas (HC) da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) analisou 245 pacientes adultos, com depressão unipolar, não psicóticos e sem ideação suicida (presença de ideias de suicídio). “A depressão unipolar é a forma mais comum de transtorno depressivo, que pode ser leve ou grave”, conta o médico. “A sua principal característica, ao contrário da depressão bipolar, é a ausência de episódios de mania no histórico do paciente, isto é, momentos em que apresenta humor eufórico e excesso de energia, além de sintomas como baixa necessidade de sono e aumento de atividades de risco.”
A ETCC é uma técnica experimental que utiliza correntes elétricas de baixa intensidade aplicadas sobre a cabeça. “Essa estimulação modula, ou seja, modifica a atividade cerebral, levando a alterações de neuroplasticidade de longo prazo. Isso muda a estrutura e a função das sinapses, que são as ligações entre as células do sistema nervoso, o que tem relação com várias funções do cérebro, como aprendizado, memória e refinamento dos movimentos”, relata Brunoni. “O escitalopram é um tratamento farmacológico de primeira linha já consagrado para os sintomas da depressão.”
Tratamento
Os pacientes tratados com a ETCC recebiam a estimulação uma vez por dia por três semanas, e depois uma vez semana até o fim do estudo, na décima semana. “Não há necessidade de preparo ou de sedação do paciente”, aponta o médico. O grupo que recebeu o escitalopram tomava 10 miligramas (mg) do medicamento por dia durante três semanas, e depois 20 mg ao dia, até a décima semana de tratamento.
O estudo concluiu que o tratamento com escitalopram é superior à ETCC e que deve ser o tratamento de escolha pelos médicos em pacientes de depressão com características semelhantes. “A maior eficácia do medicamento foi comprovada por meio de escalas clínicas que medem a gravidade da depressão”, observa Brunoni. “A ETCC deve ser reservada a casos específicos em que a terapia com uso de medicamento não é recomendada, por exemplo, quando o paciente apresenta intolerância medicamentosa, não pode utilizar medicamentos por motivo de saúde ou não queira usar por preferência pessoal”, observa o médico.
A estimulação transcraniana deve ser reservada a casos específicos em que a terapia com uso de medicamento não é recomendada, por exemplo, quando o paciente apresenta intolerância medicamentosa, não pode utilizar medicamentos por motivo de saúde ou não queira usar por preferência pessoal.
O trabalho foi realizado no HU e no Instituto de Psiquiatria (IPq) do Hospital das Clínicas (HC) da FMUSP, e teve a colaboração de pesquisadores de Boston e Nova York, nos Estados Unidos, e da Alemanha. A pesquisa contou com o auxílio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), na modalidade Jovens Pesquisadores.
Atualmente, o médico, livre-docente pelo Departamento de Psiquiatria da FMUSP, faz pós-doutorado sênior na Ludwig-Maximilians-Universität München (LMU), na Alemanha, com bolsa da Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e da Alexander Van Humboldt Foundation (AVH). O artigo Trial of Electrical Direct-Current Therapy versus Escitalopram for Depression, do qual Brunoni é o primeiro autor, foi publicado em 29 de junho no The New England Journal of Medicine, nos Estados Unidos.