Câncer infantojuvenil compromete orçamento familiar

Estudo na Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto (EERP) da USP apontou que o orçamento das famílias diante do cuidado de seus filhos com câncer fica comprometido e que o apoio social fornecido por familiares, amigos e vizinhos é fundamental para o tratamento. Esse drama é relatado por uma das mães entrevistadas: “Não vou te falar que eu passei fome, porque eu tive gente para me ajudar”. Com a pesquisa, a autora Amanda Rossi Marques-Camargo, conclui que são necessárias políticas públicas que atendam as particularidades do câncer, seja ele infantil ou em adultos.

“Mesmo com os auxílios disponíveis aos pacientes com doenças crônicas, a condição do câncer possui particularidades e deve ser visto de forma especial. Aspectos como a baixa imunidade, características do tratamento e custos familiares devem ser levados em conta na elaboração e aperfeiçoamento das políticas públicas”, afirma. Ainda, segundo Amanda, o apoio formal, aquele dado pelos órgãos públicos, não contempla as particularidades do câncer infantil e que não há iniciativas de proteção social específicas para as condições dos pacientes com câncer infantojuvenil.

A pesquisa também aponta que a maioria dos cuidadores, 88,7% era composta por mães e que boa parte delas era a provedora principal da renda familiar. “Quando os filhos foram diagnosticados, 85,6% dos participantes estavam empregados. Já quando coletamos os dados, entre junho de 2013 e fevereiro de 2014, apenas 53,6% mantiveram o vínculo”, conta Amanda.

“Custe o que custar, nosso filho está em primeiro lugar” é relato comum entre os 62 participantes do estudo, segundo a pesquisadora. Foi possível detectar que as famílias abriram mão não só de coisas teoricamente supérfluas, como atividades de lazer e aulas complementares para a criança adoecida e a família, mas também de refeições e até pagamento de contas como água e energia para privilegiar o orçamento com os cuidados do filho.

Acesso ao Tratamento
“Se a criança está com febre no meio da noite, ela terá que ir até o centro de tratamento. A disponibilização de transporte adequado é essencial para o paciente e obrigação da prefeitura de origem quando o centro de tratamento se localiza em outro município”, conta Amanda. “Quando este direito não é garantido, as famílias têm que se organizar de acordo com suas disponibilidades, muitas vezes recorrendo à ajuda de familiares, amigos e vizinhos.”

A pesquisa aponta que, cerca de 70% dos participantes já ouviram falar sobre os recursos fornecidos pelo governo para o paciente com câncer. Destes, 41,9% solicitaram o Benefício de Prestação Continuada (BPC). “Este auxílio fornece um salário mínimo para as famílias que têm renda de até um quarto do mesmo por pessoa”, fala a pesquisadora.

Devido à vulnerabilidade social e da insuficiência financeira ocasionada pelo câncer infantojuvenil, algumas famílias, mesmo não se enquadrando aos critérios econômicos pré-estabelecidos, podem receber o BPC. “Por mais que a renda seja superior, os custos com alimentação, transporte, medicamentos e cuidados com a criança ou adolescente com câncer são muito altos. Ao comprovar que os gastos com o câncer comprometem a saúde financeira do lar, o benefício pode ser concedido”, diz Amanda.

Além do BPC, quando a cidade de origem não fornece atendimento para a patologia, o paciente tem direito ao Tratamento Fora de Domicílio (TFD). “Com isso, o transporte e alimentação devem, por lei, serem custeados pelo município de origem”, afirma a pesquisadora, ao lembrar que, na prática, o benefício é concedido parcialmente, apenas com fornecimento de transporte. A dissertação de mestrado Experiência financeira de famílias no cuidado de crianças e adolescentes com câncer, orientada pela professora Lucila Castanheira Nascimento, faz parte das atividades do Grupo de Pesquisa em Enfermagem no Cuidado da Criança e do Adolescente (GPECCA) da EERP. A defesa foi realizada no segundo semestre de 2014.