Conhecimento sobre HPV e sua vacina precisa ser reforçado.
Estudo realizado em 2016 com estudantes de medicina mostrou que faltavam informações sobre a prevenção da doença, e poucos do sexo masculino haviam se vacinado.
Pesquisa realizada com alunos da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) mostrou que estudantes do sexo masculino do primeiro ano de graduação apresentavam lacunas significativas de conhecimento sobre o papilomavírus humano (HPV) e sua respectiva vacina. Apesar do nível de conhecimento aumentar conforme o curso avançava, mesmo alunos de anos posteriores podem ter se formado com poucos conhecimentos sobre segurança, esquema de vacinação e administração desses imunizantes em populações específicas.
O estudo de 2016 constatou também que, na época da coleta dos dados, apenas 18% dos 520 alunos estavam vacinados, o que pode ter influenciado no baixo nível de conhecimento sobre a vacina.
Foram entrevistados 520 graduandos do primeiro ciclo (1º, 2º e 3º anos) e do internato (5º e 6º anos). O estudo, transversal e analítico, era composto por um questionário contendo perguntas que iam desde conhecimentos básicos sobre HPV até aceitabilidade da vacina.
A análise das respostas mostrou que alunos dos três primeiros anos apresentaram 51% a mais de lacunas de conhecimentos quando comparados aos alunos nos anos finais de graduação, sendo que os estudantes do sexo masculino foram os que demonstraram conhecimentos mais insatisfatórios. Não houve aquisição de conhecimento durante o curso de medicina a respeito da indicação da vacina para portadores de HIV e contraindicação em gestantes.
Já as informações sobre a doença em si foram adquiridas conforme o curso avançava. “Como esperado, a aquisição de conhecimento foi gradual e ascendente, algo natural para quem faz a graduação em medicina”, explica ao Jornal da USP Isabel Cristina Esposito Sorpreso, professora associada da disciplina de ginecologia do Departamento de Obstetrícia e Ginecologia da FMUSP e orientadora do estudo. “A nossa surpresa foi constatar que estudantes do primeiro ano, que se autodeclararam do sexo masculino, tinham menor conhecimento sobre a vacina.”
Papilomavírus humano
HPV é a sigla em inglês para o papilomavírus humano. É a infecção viral mais comum do trato reprodutivo e é transmitida via contato sexual. Existem mais de 100 tipos de HPV, dos quais pelo menos 14 são cancerígenos. Dois tipos deles (16 e 18) causam 70% dos cânceres do colo do útero e lesões precursoras de câncer, segundo dados da Organização Pan-americana de Saúde (Opas). Em mulheres, ele pode desencadear também câncer de vulva e vagina. Homens e mulheres, se infectados, estão mais propensos de ter tumores de ânus e orofaringe e verrugas genitais.
“A pesquisa também foi importante para percebermos que alguns fatores comportamentais no curso de medicina ainda precisam ser trabalhados nos estudantes”, relata Isabel. “O tabagismo, por exemplo, é um fator de risco isolado para várias neoplasias, inclusive para o câncer de colo do útero, mas essa associação, por mais que seja óbvia, não estava clara para eles”.
“Não é que esses alunos não saibam – ou que eles vão ficar com essa lacuna de conhecimento -, mas naquele momento eles precisavam refrescar essa informação”, alerta Annielson de Souza Costa, enfermeiro, especialista em saúde pública e primeiro autor da pesquisa. “Por isso, vejo a importância da educação continuada e do aperfeiçoamento sobre determinado assunto”.
O enfermeiro lembra também sobre a importância das vacinas incluídas no PNI do Ministério da Saúde. “De todas as vacinas, essa é a única que previne o câncer do colo do útero. É essencial que nós, como profissional de saúde, tenhamos essa informação bem fresquinha na cabeça”.
Em 2018, aproximadamente 311 mil mulheres morreram de câncer de colo do útero, sendo que cerca de 90% de mortes aconteceram em países de baixa e média renda, segundo a Opas.
Vacinação no mundo
Mais de 85 países já implementaram a vacina contra o HPV em seus programas públicos de imunização e cerca de 28 milhões de doses já foram distribuídas pelo mundo. No Brasil, o insumo foi inserido no Programa Nacional de Imunização (PNI) do Ministério da Saúde em 2014.
Mas, como conta Isabel, o processo de implantação no Brasil passou por várias modificações ao longo dos anos, o que pode ter trazido muitas dúvidas aos profissionais de saúde. “No começo eram aplicadas três doses, agora, pelo SUS, são aplicadas duas, e isso pode ter colaborado com a dificuldade de aquisição de conhecimento”, relata a professora.
Costa lembra que na época da coleta dos dados apenas 18% dos 520 alunos estavam vacinados. “A gente sabe que aquele que se vacinou tem maiores chances de saber sobre a vacina e sobre o HPV”, conta. E, de acordo com o pesquisador, se a mesma pesquisa fosse feita hoje, teria outro resultado. “Com toda certeza, muito mais estudantes de medicina já se vacinaram e o conhecimento da doença e de tudo que vem com ela já é maior”.
Um artigo com todos os detalhes do estudo foi publicado na revista Plos One.
Mais informações: e-mail icesorpreso@usp.br, com Isabel Cristina Esposito Sorpreso
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