Após algumas doses a mais, é inevitável que o álcool suba à cabeça, como se costuma dizer. Mas se os efeitos inebriantes dessa ingestão são muito conhecidos, o mesmo não ocorre com sua atuação na atividade cerebral.
Um novo estudo, feito por cientistas do Instituto Salk de Ciências Biológicas e da Universidade da Califórnia em San Diego, nos Estados Unidos, acaba de dar importante contribuição para entender melhor como o álcool altera o funcionamento das células cerebrais. O trabalho foi publicado neste domingo (28/6) pela revista Nature Neuroscience.
Paul Slesinger, professor do Laboratório de Peptídeos do Instituto Salk, e colegas descobriram uma área específica para a ação do álcool localizada dentro de proteínas de canais iônicos. A compreensão de como o álcool atua no cérebro pode ajudar no desenvolvimento de tratamentos para problemas como alcoolismo, uso de drogas ou epilepsia, apontam os autores do estudo.
Sabe-se que o álcool altera a comunicação entre neurônios. Há muito interesse em descobrir como o álcool atua no cérebro. Uma das diversas hipóteses é que o álcool funciona ao interagir diretamente com proteínas de canais iônicos, mas não havia estudos que identificassem o local dessa associação, disse Slesinger.
A nova pesquisa demonstra que o álcool interage diretamente com um local específico localizado dentro de um canal iônico, que tem papel fundamental em diversas funções cerebrais associadas com eventos epiléticos e com o abuso de álcool e drogas.
Os canais, chamados de canais Girk, são abertos durante períodos de comunicação química entre neurônios e amortecem o sinal entre eles, criando o equivalente a um curto-circuito.
Quando os Girks se abrem em resposta à ativação neurotransmissora, íons de potássio são liberados pelo neurônio, diminuindo a atividade neuronal. O estudo é o primeiro a identificar que o álcool estimula os canais Girk diretamente, e não por meio do resultado de outras alterações moleculares nas células.
Achamos que o álcool sequestra o mecanismo de ativação intrínseca dos Girk e estabiliza a abertura dos canais. O álcool pode fazer isso por meio da lubrificação das engrenagens de ativação dos canais, aponta Slesinger.
Se pudermos encontrar uma droga que se encaixe no ponto específico de atuação do álcool e ative os canais Girk, talvez possamos diminuir a excitabilidade neuronal no cérebro, o que resultaria em uma nova estratégia para o tratamento da epilepsia, disse o pesquisador.
O artigo A discrete alcohol pocket involved in Girk channel activation, de Paul Slesinger e outros, pode ser lido por assinantes da Nature Neuroscience em www.nature.com/neuro.