Problemas na qualidade do sono e falta de descanso são um dos principais problemas associados à ocorrência de dores osteomuleculares, ou seja, que atingem ossos e músculos, em caminhoneiros, principalmente naqueles com turno irregular ou noturno. É isso que aponta a pesquisa feita pela fisioterapeuta Lucia Castro Lemos em sua dissertação de mestrado defendida na Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP.
A pesquisa foi feita em 2007 com 470 caminhoneiros ligados a uma transportadora localizada no interior de São Paulo, com filiais pelo País. Os entrevistados responderam um questionário que abordava as queixas de dores osteomusculares, a qualidade do sono e o trabalho em turno irregular, que incluiu o horário noturno, além do horário fixo, diurno. As respostas sobre as dores apontavam para dois intervalos de tempo, 12 meses e na semana antecedente à pesquisa.
As principais queixas foram na região do tronco, principalmente na região inferior das costas, a coluna lombar. Cerca de 27,9% dos entrevistados se queixaram de dores na região nos últimos 12 meses. A região superior das costas, a coluna dorsal, também foi bastante citada, com 26,2% de ocorrências. Outras regiões bastante citadas foram os ombros, joelhos e pescoço, independentemente do período estudado.
Nos 12 meses anteriores à pesquisa cerca de 53,5% relataram terem sido acometidos por dor em alguma parte do corpo. Entre os caminhoneiros analisados, 6,1% ficaram impedidos de realizar atividades profissionais em decorrência de dores e 10,5% procurou ajuda de algum profissional da saúde.
Lúcia explica que as dores mais freqüentes na região do tronco se devem a jornada extensa de trabalho e a manutenção da mesma postura, além dos esforços físicos e psíquicos decorrentes do trabalho noturno. A posição sentada altera a curvatura fisiológica da coluna, na chamada lordose lombar. Essa curvatura alterada provoca uma pressão maior no núcleo dentro dos discos intervertebrais, que desencadeia dor na musculatura ao redor da coluna, explica a pesquisadora.
Perfil profissional
Os caminhoneiros analisados tinham em média 40 anos de idade e, em sua grande maioria, eram casados (80%). Nas respostas, uma grande maioria diz não fumar e beber apenas em ocasiões especiais. Ela explica que o resultado chega a surpreender, já que fumar e beber são hábitos mais comuns entre os trabalhadores noturnos, conforme encontrado em outros estudos. Uma hipótese, ao menos no caso das bebidas, é que essas respostas tenham ocorrido por receio de problemas com a legislação e a fiscalização feita pela empresa.
Outro detalhe interessante está ligado ao consumo de medicação para permanecer acordado durante o trabalho, em que apenas 1% dos caminhoneiros assumiu o consumo de medicamentos estimulantes, os quais poderiam interferir na qualidade do sono. Segundo pesquisas anteriores, em média cerca de 25% relatam o uso do chamado rebite.
Quanto às jornadas de trabalho, mais de 28% dos entrevistados afirmou trabalhar mais de 10 horas por dia. A jornada de trabalho na empresa analisada varia de acordo com o perfil do transporte feito, que era dividido em três categorias: transferência, distribuição e coleta. É na transferência que se encaixam as jornadas noturnas e irregulares, é nela também que se inserem as grandes jornadas de trabalho e os percursos mais longos.
Importância do cochilo.
Dentre os problemas apontados pelos caminhoneiros como responsáveis pela dor, como estresse, pressão no trabalho, medo da violência e de acidentes, a falta de qualidade no sono foi apontada como grande vilã.
Os 31% que afirmaram ter noites de sono ruins tiveram mais queixas de dor do que os que dizem o contrário. Quanto ao habito de cochilar, 80% dos motoristas não cochilavam com freqüência, ao contrário do esperado, e apresentaram a maiores queixas para as dores osteomusculares.
Ela explica que o hábito de cochilar, ou ao menos descansar, ajuda a prevenir esse problema, pois as pausas e o repouso recuperam as estruturas musculares submetidas a sobrecargas A pesquisadora ainda acrescenta que a dificuldade para o cochilo durante a jornada de trabalho é dificultada pela pressão das empresas com relação aos prazos.
A fisioterapeuta acrescenta que independentemente da quantidade de horas trabalhadas o cochilo auxilia na diminuição das dores. O cochilo pode ser tirado em qualquer lugar. Mesmo que seja no caminhão, no posto, numa rede, o ideal é que a empresa permita pequenos cochilos durante o horário de trabalho, quando possível. Isso ajuda a melhorar não apenas as questões relacionadas ao sono e a prevenção de acidentes, mas também para reduzir a ocorrência de dores nessa população, completa a pesquisadora.
Mais informações: (11) 3061-7905, email lucalemaos@usp.br, com a pesquisadora Lucia Castro Lemos. Dissertação orientada pela professora Claudia Roberta de Castro Moreno da FSP