A partir do momento em que a pessoa é diagnosticada com o Diabetes mellitus, ela passa a ter necessidades especiais. Necessita se adequar a novos hábitos, que envolvem alimentação saudável, prática de atividade física e uso de medicamentos. Para aquele que trabalha, receber o diagnóstico de diabetes resulta na necessidade de conciliar as ações de autocuidado com a rotina de trabalho. Com isso, muitos acabam enfrentando dificuldades e aposentando-se precocemente, em função das complicações crônicas, que podem acarretar deficiências.
Partindo desse pressuposto, pesquisa na Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto (EERP) da USP, conduzida pela terapeuta ocupacional Beatriz Cardoso Lobato, com orientação da professora Carla Regina de Souza Teixeira, foi em busca de compreender as necessidades das pessoas com diabetes no trabalho, na perspectiva dos adoecidos e dos profissionais de saúde. O intuito foi mostrar quais são as condições adequadas para o autocuidado neste contexto, para mantê-los ativos no mercado de trabalho. “Os resultados da pesquisa apontam que tanto para os profissionais da saúde quanto para as pessoas com diabetes, há uma implicação recíproca entre diabetes e trabalho”, salienta Beatriz.
Segundo a pesquisadora, o diabetes pode comprometer o desempenho no trabalho com manifestação de sintomas agudos como sudorese, cansaço e sonolência. Assim como o trabalho pode interferir no controle glicêmico em função da rotina e ritmo imposto ao trabalhador. “O trabalhador com diabetes mostra-se incomodado com a percepção dos colegas de trabalho sobre os sintomas do diabetes, como o suor, por exemplo. Como optam por não contarem que têm diabetes, mudanças em seu comportamento e desempenho, em função de alterações da glicemia, podem ser interpretadas equivocadamente pelos empregadores e colegas de trabalho, podendo comprometer sua permanência no trabalho”.
A tese Sempre foi velado: um modelo teórico sobre os significados de ser trabalhador com diabetes na perspectiva do adoecido e dos profissionais de saúde, defendida em julho de 2014, conta com a percepção de 11 pessoas com diabetes inseridas no mercado de trabalho e de oito profissionais da saúde.
Mudanças
Após entrevistar trabalhadores com diabetes que realizam seguimento no Centro de Saúde Escola da Cuiabá, no Bairro Sumarezinho, em Ribeirão Preto, interior de São Paulo, Beatriz constatou que pessoas com esta condição crônica apresentam dificuldades em conciliar as ações de autocuidado orientadas pelos profissionais de saúde, com a rotina e ritmo imposto pelo mercado de trabalho.
“As pessoas com diabetes necessitam alimentar-se a cada três horas. Embora a pausa para o lanche seja prevista na legislação e no horário de trabalho, nem sempre a pausa acontece na prática. Aspecto que se agrava para a pessoa com diabetes, que embora reconheça sua necessidade, revela o receio de ser compreendida como menos produtiva ao realizar a pausa no trabalho” afirma a terapeuta ocupacional.
Segundo Beatriz, as adaptações no ambiente de trabalho são simples e baratas. “Para as pessoas com diabetes que utilizam insulina, há a necessidade de um refrigerador para armazenar o medicamento. Além disto, uma escala entre os funcionários pode viabilizar as pausas para a refeição”.
As mudanças propostas em sua pesquisa, diz Beatriz, se aderidas pela justiça, podem trazer melhoras significativas para o cotidiano das pessoas com diabetes. “Precisamos de leis trabalhistas que definam os direitos destas pessoas no contexto do trabalho, com o intuito de promover as condições necessárias para a realização de autocuidado e desenvolvimento profissional”.