A experiência de uma gravidez precoce, não planejada, muitas vezes gera angústia e conflitos para as adolescentes. Entrevistas realizadas após o parto reforçam a importância do apoio familiar e indicam a necessidade de melhorar o atendimento a adolescentes grávidas. A constatação é parte dos resultados de uma pesquisa desenvolvida na Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto (EERP) da USP.
Segundo a enfermeira Lígia Gonzaga Ramos Laudade, autora da dissertação Maternidade na adolescência: Apoio social da família para o cuidado materno e autocuidado na perspectiva das adolescentes, a partir do momento em que a jovem conta com o respaldo da família, ela se responsabiliza, de fato, pelos cuidados do recém-nascido, e se mostra capaz de exercer a função de mãe. “Ela também percebe que deve se cuidar para que esteja bem e cuide, de forma satisfatória, do filho”, conta.
A pesquisa, orientada pela professora Ana Márcia Spanó Nakano, acompanhou 14 adolescentes usuárias do Sistema Único de Saúde (SUS), atendidas na maternidade da Santa Casa de Caridade de Guaranésia, cidade localizada no sudoeste de Minas Gerais. Por meio de abordagem quantitativa e qualitativa, foi traçado o perfil dessas jovens. Entrevistas realizadas após o parto reforçaram a importância do apoio familiar e indicam a necessidade de melhorar o atendimento a adolescentes grávidas.
Com idade média de 18 anos, a maioria das adolescentes grávidas entrevistadas na pesquisa cursou até o primeiro ano do ensino médio. Apenas uma delas trabalhava antes da gravidez e, depois do parto, manteve-se no emprego. “A maternidade na adolescência se apresenta como um momento de dificuldades, uma vez que a adolescente rompe bruscamente com o processo natural de amadurecimento e crescimento do ser humano”, conta Lígia.
Gravidez não planejada
A gravidez foi considerada não planejada por 85,71% das jovens; a maioria delas começou o pré-natal tardiamente, após a 30ª semana de gestação. Já sobre o parceiro, 35,71% não continuaram o relacionamento e 14,28% precisaram realizar o teste de DNA para comprovar a paternidade. Mesmo com esse contexto, “muitas meninas mostram-se capazes e responsáveis pelos cuidados com o recém-nascido, demonstrando consciência, autonomia e responsabilidade”, afirma a pesquisadora.
“A maioria das adolescentes tem, no exercício da sexualidade, uma forma de adquirir autonomia e liberdade. É como um grito de liberdade, ressoado sob os olhares atônitos de seus pais”, alega a pesquisadora, destacando que os pais têm dificuldade em conversar com seus filhos sobre sexo e que a grande maioria dos jovens inicia sua vida sexual sem que seus pais tomem conhecimento.
Diante da notícia de uma gravidez, as reações são diversas, porém, segundo Lígia, a maioria dos familiares se diz surpresa, como se fosse um “choque”. Esse fato, garante a pesquisadora, pode gerar consequências negativas. “Com medo do abandono dos parceiros ou da repreensão dos pais, algumas adolescentes podem tomar atitudes que trazem consequências para o feto, como o aborto, a não realização do pré-natal ou a realização tardia”.
O apoio familiar é evidenciado na pesquisa como o mais importante para a adolescente, uma vez que possibilita que ela ultrapasse todos os problemas relacionados com a maternidade. “O ideal é que de alguma forma após a descoberta da gestação, os familiares se organizem no sentido de oferecer apoio a adolescente”, sugere.
Problema de saúde pública
Os resultados do estudo reafirmam a gravidez na adolescência como um problema de saúde pública, pois envolve uma variedade de experiências vividas por essas garotas, geralmente relacionadas às baixas condições socioeconômicas e evasão escolar. “Apesar de todas as dificuldades vivenciadas pelas adolescentes, quando estas têm o apoio da família esse processo de enfrentamento dos problemas torna-se mais tranquilo, o que gera beneficio para toda a sociedade”, lembra Ligia.
Complicações relacionadas à prática do aborto, anemia, desnutrição, hemorragias e depressão pós-parto são os chamados “riscos biológicos” enfrentados pelas adolescentes, que podem elevar o número de casos com complicações e até mesmo de mortes perinatais.
“Muitas vezes, o profissional da saúde está despreparado para atender às necessidades destas adolescentes em seu contexto social. Sendo assim, é necessário traçar políticas mais efetivas que possibilitem o apoio aos familiares e também às adolescentes, minimizando os riscos para a mãe e o filho”, explica a pesquisadora, para quem dicou evidente a falta de apoio dos serviços de saúde nesses casos.