Energia para os neurônios

Em um final de tarde de janeiro, o psiquiatra Leandro Valiengo abriu um dos armários do já quase deserto quarto andar do Hospital Universitário (HU) da Universidade de São Paulo (USP), retirou uma mala preta, colocou-a sobre o colchonete azul de uma maca e apresentou o equipamento que está sendo visto como uma nova forma de tratamento contra depressão e outros distúrbios neuropsiquiátricos: é um aparelho de estimulação transcraniana de corrente contínua (ETCC). “É muito simples”, ele diz.

O aparelho é uma caixa de tamanho aproximado ao de um laptop, com um teclado para se registrar o código de cada paciente em tratamento e alguns botões para regular o fornecimento de energia. De uma das laterais saem dois fios em cujas pontas há dois eletrodos – um positivo e um negativo – que são fixados nas têmporas por meio de uma bandana. Os eletrodos geram uma corrente elétrica de baixa intensidade que atravessa o córtex, a região mais superficial do cérebro, durante 20 a 30 minutos seguidos, e desse modo ajuda a restabelecer o funcionamento normal dos neurônios.

Por meio de estudos realizados em vários países, milhares de pessoas – cerca de 250 delas no Brasil – já foram tratadas por meio da ETCC, uma técnica experimental que amadurece a passos firmes, aparentemente com efeitos colaterais mínimos, e ganha consistência como alternativa ou complementação ao uso de medicamentos, principalmente contra depressão, o mais disseminado dos distúrbios psíquicos.

Um levantamento coordenado por pesquisadores da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) detectou os sintomas da depressão em quase um terço da população brasileira. Novas técnicas de tratamento são a princípio bem-vindas porque 30% das pessoas com depressão não respondem aos medicamentos atuais, que, quando aceitos, podem causar efeitos colaterais indesejados, como ganho de peso, perda de libido ou insônia, que limitam a adesão ao tratamento.

Em outubro de 2013, o psiquiatra André Brunoni e sua equipe do Hospital Universitário da USP iniciaram um teste amplo em que 240 participantes com depressão grave, divididos em três grupos, deviam receber diariamente, durante 10 semanas, estimulação elétrica real ou simulada, um antidepressivo conhecido como escitalopram (Lexapro) ou placebo.

Realizado no Centro de Pesquisas Clínicas e Epidemiológicas do HU-USP em colaboração com o Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP, esse estudo é chamado de duplo-cego porque os participantes e os pesquisadores só sabem no final se o que foi aplicado era um tratamento efetivo ou simulado (a enfermeira coloca os eletrodos na têmpora dos participantes, mas não sabe se de fato se formou uma corrente elétrica entre os eletrodos).

Se tudo correr bem, esse teste deve indicar se o efeito da estimulação elétrica poderia ser equivalente ou superior ao do medicamento e, além disso, qual o perfil das pessoas com depressão que poderiam responder melhor a um tipo ou outro de tratamento, de acordo com seu perfil genético e comportamental, que serão avaliados por meio de exames de sangue, tomografias e entrevistas ao longo de quatro anos.

Em um estudo anterior, com 103 participantes com depressão grave acompanhados durante seis semanas, Brunoni e sua equipe verificaram que a estimulação elétrica poderia ampliar o efeito de um antidepressivo de uso amplo, a sertralina), que, assim como o escitalopram, apresenta o mesmo mecanismo de ação da fluoxetina – todos prolongam a ação de neurotransmissores como a serotonina, essenciais para o funcionamento dos neurônios.

De acordo com o artigo que detalha os resultados, publicado em 2013 no JAMA Psyquiatry, o efeito do tratamento combinado – estimulação elétrica e sertralina – foi não só mais intenso, mas também mais rápido, já que os participantes desse grupo relataram remissão dos sintomas a partir da segunda semana de tratamento, enquanto os de outros grupos, que haviam tomado apenas medicação, estimulação elétrica ou placebo, relataram melhoras no bem-estar seis semanas após o início da terapia.

Leia a reportagem completa em: http://revistapesquisa.fapesp.br/2014/02/12/energia-para-os-neuronios.

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