No Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP, pesquisadores comprovaram por meio de testes em modelos animais que o Tamoxifeno, medicamento tradicionalmente usado no tratamento do câncer de mama, pode ser eficaz para tratar a infecção por Leishmania amazonensis, doença cutânea causadora de úlceras na pele. De acordo com a professora Silvia Reni Bortolin Uliana, do Departamento de Parasitologia do ICB, testes com animais ainda estão sendo realizados. A utilização em humanos ainda depende de testes, que podem demorar vários anos, estima a pesquisadora. Os resultados das pesquisas foram publicados recentemente na revista PloS Neglected Tropical Diseases, na edição de junho.
O tratamento usado atualmente para a leishmaniose é feito por meio de injeções ou aplicações intravenosas com três classes de drogas: os antimoniais pentavalentes, anfotericina B e pentamidina. Esses medicamentos, no entanto, apresentam efeitos colaterais, podendo causar danos ao rim, fígado e até arritmia cardíaca, diz Silvia. O tratamento, como ela explica, deve durar aproximadamente 20 dias. São injeções doloridas e, em muitos casos, pessoas atingidas pela doença não têm acesso a serviços de saúde, o que permitiria uma aplicação intravenosa.
Silvia conta que na Índia, há cerca de um ano, um novo medicamento vem sendo utilizado. Trata-se do Miltefosine, que ainda não foi aprovado no Brasil e encontra-se em fase de testes no resto do mundo. Na Índia a droga vem sendo aplicada devido à situação de gravidade da doença naquele país.
Testes in vitro
A pesquisadora conta que os testes com o medicamento visando sua utilização contra a leishmania começaram há cerca de quatro anos. Os primeiros experimentos foram realizados in vitro. As experiências com camundongos foram iniciadas há dois anos e ainda devem prosseguir. Nos testes, os pesquisadores infectaram grupos de animais com a leishmania e, após quatro a cinco semanas, os camundongos foram submetidos a um tratamento de 15 dias. Após a interrupção do tratamento, os animais foram observados por mais 6 a 10 semanas. Percebemos que os camundongos tratados com o Tamoxifeno tiveram o desenvolvimento da doença muito retardado ou apresentaram cicatrização das úlceras. No final do experimento, foram quantificados os parasitas no local da infecção e observamos redução dels entre 99,7% e 99,8%, descreve Silvia.
O Tamoxifeno é um medicamento usado no tratamento e prevenção do câncer de mama há cerca de 30 anos. Isso permitiu consultas a uma extensa literatura sobre o medicamento, que em casos de câncer de mama é administrado por um período de cinco anos contínuos, informa a pesquisadora.
De acordo com Silvia, os pesquisadores do ICB perceberam que o medicamento pode induzir ao aumento de óxido nítrico nas células tumorais. No animal infectado, o parasito vive num macrófago, que é uma célula capaz de produzir o óxido nítrico. Assim, a indução à produção do óxido nítrico seria importante no combate à leishmania, descreve.
Outra observação importante que havia sido descrita anteriormente era de que o Tamoxifeno pode influenciar o pH de compartimentos celulares. Ele é capaz de aumentar o pH da célula. Como o parasita depende de pH ácido para sobreviver, supusemos que a droga pudesse influenciar a sobrevivência da Leishmania, conta a pesquisadora.
A Leishmania amazonensis causa uma doença cutânea que provoca úlceras na pele entre cinco e dez centímetros de diâmetro. Essa forma da infecção não chega a representar risco de morte, a não ser que ocorra infecção secundária, descreve Silvia. Esse parasita ainda pode determinar uma outra forma clínica, chamada forma difusa. Nesse caso, aparecem nódulos por todo o corpo. Segundo a pesquisadora, esta é a forma mais grave da doença.
A professora conta que esta infecção é mais comum na Amazônia. Ela é transmitida por uma mosca chamada Lutzomyia flaviscutelatta. Este inseto é encontrado em toda a Amazônia e também na região Centro Oeste do País, lembra Silvia. A pesquisadora também conta com a colaboração de Danilo Ciccone Miguel, estudante do programa de doutorado do Departamento de Parasitologia do ICB, que vem desenvolvendo sua tese sobre este mesmo tema.
Mais informações: (11) 3091-7334, com a professora Silvia Reni Bortolin Uliana; e-mail srbulian@icb.usp.br