A partir da análise das ocorrências de mordedura animal envolvendo carteiros da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT), a médica veterinária Maria de Lourdes A. B. Reichmann coordenou a elaboração de um Programa de Prevenção Contra Ataques de Cães que representou uma queda de 62,5% na gravidade desse tipo de ocorrência. Os dados são apresentados no estudo de doutorado de Maria de Lourdes, defendido no último mês de dezembro na Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ) da USP.
As mordeduras sempre acabam acontecendo. Porém, os resultados do Programa mostram que entre 2000 e 2004 a gravidade das mordidas diminuiu, assim como a curva de dias parados em virtude de mordedura animal, conta a pesquisadora.
Maria de Lourdes relata que por volta do ano 2000, a diretoria da ECT (regional São Paulo) procurou o Instituto Pasteur entidade ligada à Secretaria da Saúde do Governo do Estado de São Paulo, dedicada à pesquisa científica sobre a raiva animal em busca de uma solução para um problema: na Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), 80% dos afastamentos de carteiros (dias parados por acidentes de trabalho) tinham como causa mordidas de cães ocorridas durante a entrega de correspondências.
A partir de entrevistas e reuniões com carteiros e outros funcionários dos Correios, uma equipe do Instituto Pasteur liderada por Maria de Lourdes analisou as ocorrências e as circunstâncias em que elas ocorriam. Com isso elaboramos um Programa de Prevenção Contra Ataques de Cães, baseado principalmente na prevenção das ocorrências e que envolve ações direcionadas aos carteiros, às chefias e também aos donos de animais, informa a pesquisadora, que trabalha como assessora técnica da diretoria do Instituto.
Após várias outras reuniões chegou-se a um manual técnico para esse Programa, que passou a ser usado nos cursos de formação e treinamento de carteiros, e que contém material audiovisual tratando do tema. Foram trabalhadas 168 unidades operacionais da RMSP. Atualmente, o Programa, na forma como foi elaborado, está sendo implantado em todo o Brasil, pois o problema com os carteiros é o mesmo em qualquer região, conta.
Atitudes preventivas
A mordedura ocorre quando o cão identifica a ação de uma pessoa como invasão de território. Isso acontece, por exemplo, quando o carteiro passa a mão por entre ou sobre as grades do portão para colocar as correspondências dentro da caixinha. O cão entende que seu território está sendo invadido. Então, para defendê-lo ele ataca, informa a pesquisadora.
A recomendação é que o carteiro passe a entregar a correspondência sem colocar as mãos para além dos portões. O dono do animal deve instalar uma caixa de correspondência que tenha abertura do lado de fora ou aumentar as grades. Se isso não puder ser feito, é preciso afastar o animal do portão ou mantê-lo preso durante as entregas das cartas.
Já o carteiro deverá ficar muito atento ao cão que apenas late ao perceber sua aproximação. Isso é necessário, explica Maria de Lourdes, pois é um mesmo profissional que fica responsável pelas entregas em uma determinada região, o que o faz visitar a mesma casa constantemente. O cão passa a reconhecê-lo. No início, o cachorro apenas late, mas com o passar do tempo, ele passa a avançar, e em seguida, a morder: primeiro levemente, e depois com mais força, e assim por diante.
O carteiro deverá comunicar o fato aos seus superiores para que o dono do animal seja informado sobre o problema, orientado sobre como proceder e receba um prazo para resolver a situação. Em último caso, se o risco de mordedura persistir mesmo após várias notificações e orientações, então o dono do cão passará a retirar as próprias correspondências na Agência dos Correios mais próxima de sua casa.
Sub-notificação
Para a ECT, uma das recomendações foi a de registrar essas ocorrências como mordedura animal e não acidente de trabalho por causa externa, como era feito antes deste programa ser iniciado, fato que facilitou dimensionar e acompanhar o problema.
Maria de Lourdes lembra que, além dos carteiros, há vários outros profissionais que também enfrentam esse mesmo tipo de problema, como os entregadores de pizza, e os que fazem a medição de consumo de água e luz em residências. Por enquanto, o material ainda não está disponível para consulta pública. Estou aguardando liberação do Ministério das Comunicações, visto que o trabalho teve a participação direta da ECT (material audiovisual, funcionários, etc), informa a pesquisadora.
Mais informações: e-mail mlreichmann@uol.com.br, com Maria de Lourdes Reichmann. Pesquisa orientada pela professora Sonia Regina Pinheiro