Transtornos mentais de mães prejudicam educação dos filhos

Uma pesquisa feita com mães portadoras de depressão ou transtornos de ansiedade revelou a necessidade de qualificação do suporte social para melhorar a educação de seus filhos. De acordo com a terapeuta ocupacional Andrea Ruzzi Pereira, nas famílias em que as mães são acometidas por esses males as chamadas práticas parentais, que incluem estratégias para orientar a educação dos filhos, são prejudicadas. “A qualificação do suporte certamente irá melhorar esses cuidados”, afirma.

Para sua dissertação de mestrado, Doença mental materna: ações de parenting e suporte social, defendida na Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão Preto (FMRP), a terapeuta empreendeu uma pesquisa com 41 mulheres com depressão ou transtornos de ansiedade. “Sem exceção, essas mães sofriam de problema crônico e estavam em tratamento há alguns anos”, conta Andrea. O estudo também envolveu os filhos adolescentes, com idade 14 e 18 anos. “A maioria das mães sofria mesmo de depressão. Utilizamos ainda a categoria transtorno misto de ansiedade e depressão, mas sempre tinha o fator depressão junto”, esclarece a autora do trabalho. Outras 41 mães saudáveis e com filhos na mesma faixa etária responderam os questionários.

As mães responderam questões como “Com quem você realmente pode contar para ouvi-la quando você precisa conversar?”; “Você acha que é parte importante da vida de quais pessoas?”, entre outras. Elas apontaram as pessoas que constituíam sua rede social e poderiam listar até nove pessoas – um membro da família, um parente, um vizinho. Em seguida, elas deviam indicar a satisfação com esse suporte, em escala variando do “muito satisfeito” ao “muito insatisfeito”.

Nos dois grupos, as mães apontaram, na média, o mesmo número de pessoas: três. Ser ou não ser portadora de transtorno mental pareceu não fazer qualquer diferença. Foi apenas na percepção da qualidade do suporte social que houve divergência: as mães deprimidas tendiam invariavelmente a avaliações negativas. Reclamavam uma qualificação das relações já existentes, e não um acréscimo de novas pessoas. Para Andrea, o resultado foi inesperado: “Isso nos leva a pensar não em aumentar a quantidade, mas em fortalecer a qualidade da rede de suporte social. A princípio, pensava-se o contrário”, admite.

Educação e cuidado
Cada adolescente que participou do trabalho recebeu um questionário sobre responsividade e exigência parentais. Assim, pôde-se entender como eles julgavam atitudes e práticas parentais de suas mães e pais. “Depois, aplicamos esse mesmo questionário à mãe, para compararmos com o que o filho havia respondido”, conta a pesquisadora

A idade, a faixa escolar e os anos de estudo dos adolescentes eram exatamente iguais nos dois grupos, e a condição socioeconômica das famílias era tão parecida quanto possível: todas elas viviam na mesma cidade do interior paulista. Buscou-se apanhar adolescentes de um mesmo bairro – o objetivo era evitar qualquer tipo de viés. “No Brasil, grande número das famílias em que a mãe é portadora de transtorno mental é de classe C para baixo. A maior faixa é C, mas é seguida pela D.” O trabalho esteve de acordo com a realidade: dentre todas participantes das pesquisas, apenas uma pertencia à classe A, e duas à B.

Uma eventual condição financeira precária influencia negativamente os cuidados que a mãe deprimida dispensa ao filho. “Mas o suporte social adequado pode atuar como fator protetivo, influenciando positivamente. Pessoas que têm melhor rede social acabam conseguindo ajuda de forma a minimizar a questão da miséria e, como conseqüência, o impacto da doença”, observa a autora.

Questão familiar
Todas as 41 mães com transtorno mental escolhidas estavam em tratamento no serviço público de saúde: ou do Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) ou do ambulatório de saúde mental da cidade onde moravam. Faziam uso de medicamentos, terapia em alguns casos – mas não havia qualquer caso de internação. Elas deviam estar em tratamento há quatro anos, pelo menos. Porque, num período de até seis meses, não é certo que seja de fato um problema crônico: considera-se ainda um surto agudo da doença. “Selecionamos aquelas que tinham doença mais crônica, para que o adolescente tivesse passado por um período de convivência com aquela situação”, avalia Andrea. O transtorno mental é recorrente: a pessoa melhora, depois o quadro recai, então vem nova melhora, assim por diante. Ao longo de quatro anos, o adolescente certamente enfrentou todas as etapas.

Usualmente, os serviços de saúde tratam a mãe, mas o filho também pode vir a ter problemas. A autora do trabalho conclui: “Essa mãe pode não ser provedora de cuidados que o desenvolva como cidadão. E se temos dados de que esse filho vai ter algum cuidado prejudicado, e que ele pode ter problema social e de saúde, os serviços de saúde poderiam trabalhar na prevenção. Qualificar o desenvolvimento no sentido na prevenção.”

Mais informações: (0XX19) 3584-4316; e-mail ruzzipereira@ig.com.br. Pesquisa orientada pelo professor Jair Licio Ferreira Santos

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

For security, use of Google's reCAPTCHA service is required which is subject to the Google Privacy Policy and Terms of Use.