Comunicação falha entre os sistemas de notificação de aids e tuberculose, pouca ou nenhuma qualificação específica por parte de médicos e profissionais de saúde e falta de orientação para os pacientes com aids, no que cabe a comportamentos de risco, são os principais problemas detectados pela psicóloga Helena Lima em estudo sobre a adesão ao tratamento do vírus HIV em pacientes triplo estigma, ou seja, portadores da síndrome que também são usuários de drogas e estão com tuberculose.
A tese de doutorado de Helena, defendida em abril de 2006 na Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP, surgiu de um projeto coordenado pela pesquisadora para o Centro de Controle de Doenças (CDC) do governo dos Estados Unidos sobre vulnerabilidade a doenças sexualmente transmissíveis (DST), entre elas a aids, e uso abusivo de drogas, em oito cidades brasileiras: Rio Branco, Epitaciolândia e Brasiléia (AC), Recife (PE), Itajaí (SC), Uruguaiana e Rio Grande (RS) e Foz do Iguaçu (PR).
A partir desse projeto, ela notou a dificuldade das pessoas com aids em aderir ao tratamento, agravada pelo abuso de drogas e pela tuberculose. Ela concentrou a questão para um estudo no município de São Paulo, onde sua tese foi formulada. Dos 22 serviços públicos para soropositivos da cidade (21 municipais e um estadual), cinco foram escolhidos para a aplicação da pesquisa, sendo um em cada região da cidade, onde se constatou maior prevalência de co-infecção aids/tuberculose e usuários de drogas registrados.
Qualitativa, tal pesquisa é denominada RARE (Rapid Assessment, Responsed and Evaluation Acesso Rápido e Pronta Resposta), e consiste em estudo com o compromisso de fazer a devolutiva para a comunidade pesquisada e para os formuladores de políticas públicas, de acordo com Helena.
Foi a partir dessa devolutiva, por exemplo, que ocorreu a integração dos sistemas de notificação de casos de tuberculose e aids no município. Quem ia para o sistema de tuberculose, não tinha a aids notificada, e vice-versa, constatou a pesquisadora. Outros problemas detectados, além do que Helena considera um buraco na comunicação, são a formação dos médicos e profissionais de saúde e a conscientização por parte do paciente, e também do profissional, de que o uso de drogas interfere de modo negativo na aplicação do chamado coquetel, a terapia anti-retroviral: Não existe conhecimento por parte dos médicos, exceto os infectologistas, dos efeitos da ação conjunta de drogas de aids e tuberculose e psicoativos. É necessária uma capacitação específica na área de drogas, defende. A disseminação da tuberculose pelo uso de cachimbos de crack é outro fator de risco apontado pela psicóloga.
Mudanças
O trabalho de Helena gerou algumas respostas, creditadas, em sua maioria, à natureza da pesquisa e suas devolutivas. A Secretaria Nacional Anti-Drogas (Senad), do Governo Federal, pensa em mobilizar uma capacitação específica para o tratamento de pacientes triplo estigma, assunto que será abordado no 1o. Seminário Internacional da Rede de Pesquisa Sobre Drogas, a ser realizado de 3 a 5 de outubro, em Brasília.
Também houve a sensibilização das unidades de tratamento e a elaboração de uma cartilha, cuja distribuição, no entanto, foi interrompida devido aos cortes de verbas da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) no que cabe a programas que incentivam a redução de danos no uso de drogas, em vez da simples proibição do consumo de entorpecentes. São cerca de 900 comprimidos por mês para quem toma o coquetel contra a aids e a tuberculose. É grande a necessidade do paciente em ser orientado sobre como lidar com seu corpo e com a sua sexualiade, afirma Helena, que completa: É fundamental uma Política Nacional de Adesão, em que cada paciente tenha seu protocolo artesanal, e que as formas de busca dos pacientes faltosos ou desistentes sejam aperfeiçoadas.
Mais informações: (0XX11) 3751-4401 ou 9384-2145, com Helena; e-mail helenali@usp.br. Pesquisa orientada por Péricles Alves Nogueira