Um novo estudo sugere que pessoas que usam o remédio semaglutida, vendido com os nomes comerciais Ozempic, Wegovy e Rybelsus, parecem ter um risco maior de desenvolver uma doença ocular grave.
Ao analisar dados de 17 mil pacientes ao longo de seis anos, pesquisadores norte-americanos descobriram que aqueles que tomavam esses medicamentos para tratar o diabetes tipo 2 tinham quatro vezes mais risco de serem diagnosticados com a doença em comparação com os indivíduos que não faziam esse tratamento.
Já para aqueles que tomavam a semaglutida para tratar a obesidade, o risco de desenvolver a doença oftalmológica foi sete vezes maior.
No entanto, os investigadores não conseguiram provar que a semaglutida esteve diretamente relacionada ao problema ocular, que pode levar à perda de visão em um dos olhos, tampouco foram capazes de explicar os motivos por trás desse risco aumentado ou a diferença entre os grupos.
Vale ainda destacar que o número de pacientes afetados pela doença ocular foi pequeno.
O Ozempic é injeção de 1 miligrama, prescrita contra o diabetes tipo 2. O Rybelsus vem em comprimidos de 3,7 ou 14 mg, também usados no diabetes. Já o Wegovy é injeção de 2,4 mg, utilizada contra a obesidade.
‘Corpo pronto para a paria’
A Novo Nordisk, farmacêutica que fabrica o medicamento, disse que a segurança dos pacientes é “uma prioridade máxima” e apontou que estudo tem muitas limitações.
Os ensaios clínicos mostram que a semaglutida pode ajudar pessoas com obesidade a perder mais de 10% do peso corporal, se o tratamento for acompanhado por mudanças na dieta e no estilo de vida.
O lançamento da droga gerou um grande entusiasmo, ainda mais depois que celebridades começaram a postar nas redes sociais sobre uma repentina perda de peso enquanto faziam o tratamento.
Apesar de estar disponível apenas com receita médica para pessoas com diabetes tipo 2 (Ozempic e Rybelsus) ou com obesidade (Wegovy), muitos estabelecimentos on-line vendem as injeções de semaglutida com poucas verificações sobre a pessoa que faz a compra.
Como resultado, especialistas e autoridades de saúde dizem estar preocupados com o fato de o medicamento ser utilizado indevidamente como “uma solução rápida” para pessoas que querem preparar o “corpo para a praia”.
Todos os medicamentos apresentam efeitos colaterais potenciais.
Para a semaglutida, alguns dos eventos adversos mais frequentes incluem:
- náusea
- vômito
- diarreia
- dor de estômago
- constipação
Problemas de visão são listados como um dos efeitos colaterais potenciais mais graves, tanto na bula do Ozempic quanto do Wegovy.
O nome específico do quadro avaliado na pesquisa é neuropatia óptica isquêmica anterior não arterítica. Essa condição afeta até 10 em cada 100 mil pessoas na população em geral, relatam os pesquisadores da Escola de Medicina da Universidade Harvard, nos EUA.
Acredita-se que o problema seja causado pela redução do fluxo sanguíneo para o nervo óptico, que faz a conexão dos olhos com o sistema nervoso. Atualmente, não existem tratamentos disponíveis para lidar com esse quadro.
O estudo recente sobre a semaglutida encontrou:
- 17 casos da neuropatia óptica entre pacientes com diabetes tipo 2 que tomam semaglutida;
- seis casos entre pacientes com diabetes tipo 2 que tomam outros medicamentos;
- 20 casos entre pacientes com sobrepeso e obesidade em uso de semaglutida;
- três casos entre pacientes com sobrepeso e obesidade que tomam medicamentos diferentes.
Joseph Rizzo, autor do estudo e professor de oftalmologia de Harvard, entende que as descobertas são significativas, mas ainda inconclusivas.
“Estudos futuros são necessários para avaliar essas questões em uma população muito maior e mais diversa”, admite ele.
Já especialistas do Royal College of Ophthalmologists, no Reino Unido, recomendam que os pacientes que tomam semaglutida sejam informados sobre o risco de desenvolver doenças oculares, mesmo que essa probabilidade seja pequena.
Equilíbrio entre benefícios e efeitos colaterais
Devido ao pequeno número de pacientes afetados pela doença ocular no estudo —que podem não ter tomado a medicação conforme as orientações em bula, por exemplo — as estatísticas sobre o risco não são precisas.
A Novo Nordisk argumenta que o estudo não levou em consideração se os pacientes fumavam ou há quanto tempo tinham diabetes — outros fatores que podem afetar a visão. O laboratório também apontou problemas na identificação precisa de casos de doenças oculares entre os pacientes avaliados.
Um porta-voz da empresa declarou: “A neuropatia óptica isquêmica anterior não arterítica não está listada como uma reação adversa medicamentosa conhecida para formulações comercializadas de semaglutida.”
“A semaglutida foi estudada em grandes estudos de evidências de mundo real e em programas robustos de desenvolvimento clínico”, complementou.
O medicamento também é avaliado em pesquisas sobre seus possíveis efeitos positivos na retinopatia diabética, uma doença ocular que acomete indivíduos com diabetes tipo 2. Esse estudo deve ser concluído em 2027.
Graham McGeown, professor honorário de fisiologia da Queen’s University Belfast, na Irlanda do Norte, avalia: “Dado o rápido aumento no uso de semaglutida e seu possível licenciamento para uma série de problemas além da obesidade e diabetes tipo 2, esta questão [dos problemas oculares] merece um estudo mais aprofundado.”
“Os possíveis efeitos colaterais dos medicamentos precisam sempre ser equilibrados com os benefícios prováveis”, conclui ele.