Estudo analisa dados da violência contra idosos

Uma pesquisa recente desenvolvida pelo Centro Latino-Americano de Estudos de Violência e Saúde (Claves) da Fiocruz analisou dados referentes à violência contra pessoas idosas. O levantamento foi feito por meio das duas instituições que prestam assistência ao idoso no Estado do Rio de Janeiro – a Delegacia do Idoso e o Núcleo Especial de Atendimento à Pessoa Idosa (Neap). As informações obtidas foram classificadas em função do tipo de crime, das características sócio-econômicas e demográficas e das características do agressor.

Paralelamente ao levantamento dos dados, um questionário foi aplicado a idosos (pessoas com mais de 60 anos) que vivem nas comunidades de Manguinhos, bairro do Rio de Janeiro onde se localiza a Fiocruz. Foram selecionados 72 idosos – seis de cada uma das 12 comunidades que cercam a Fundação – para responder a um questionário sobre suas condições sociais, econômicas e demográficas. As principais queixas dos idosos disseram respeito a maus-tratos físicos ou psicológicos, sobretudo no ambiente doméstico, à negligência, ao abandono, ao estelionato e à apropriação indébita de bens.

Os dados analisados agora pelo Claves foram colhidos em 2000, quando 13.436 idosos morreram por acidentes ou violência no Brasil – 37 por dia. Outros 92.796 foram internados por lesões ou envenenamentos no mesmo período. Os homens representaram 66,12% do total de óbitos, número que confirma o padrão de maior risco de morte por causas violentas para o sexo masculino também entre os idosos. Parte das mortes por acidentes de transporte e quedas são provocadas por negligência ou por falta de respeito. Arrancadas bruscas dos ônibus e falta de paciência quando atravessam a rua são algumas das queixas mais freqüentes dos idosos. E o mais grave é que os especialistas estimam que 70% das lesões e traumas sofridos pelos velhos não chegam a fazer parte das estatísticas.

A rede de proteção ao idoso ainda é muito frágil. Só existe uma delegacia especializada em atendimento a idosos em todo o estado, o que é claramente insuficiente. A divulgação dos centros de atendimento é precária. “Na comunidade de Manguinhos, poucos idosos sabiam da existência do Neap”, diz a pesquisadora do Claves Edinilsa Ramos. E mesmo nas poucas instituições existentes para o atendimento aos idosos, foi observado que os funcionários não haviam sido devidamente treinados para atendê-los. Além disso, não há articulação entre essas instituições nem continuidade nos programas de atendimento aos idosos. Eles nascem e desaparecem ao sabor dos programas políticos do momento.

Morando com o inimigo

Sabe-se que cerca de dois terços dos agressores são parentes – 40% das queixas são contra filhos, netos ou cônjuges e outros 7% referem-se a outros parentes – mas muitos idosos ainda têm medo de prestar queixa da violência doméstica. “Eles temem que os parentes que os maltratam possam sofrer retaliações, tanto por parte das autoridades legais como dos traficantes da área”, diz Edinilsa.

A maioria dos idosos é independente para exercer atividades do dia-a-dia. Grande parte da renda das famílias vem da sua aposentadoria ou pensão. Eles reclamam da relação com as gerações mais novas. “A queixa é de falta de respeito dos jovens em relação a eles”, afirma Edinilsa.

Apenas 25% dos idosos brasileiros ganham três salários mínimos ou mais. Ou seja, 75% deles são pobres ou miseráveis e moram com famílias igualmente pobres. Alguns deles não têm documentos como carteira de identidade, título de eleitor e certidão de nascimento, mesmo tendo mais de 60 anos. A escolaridade dos idosos de Manguinhos é muito baixa, com alto índice de analfabetismo. “A ausência de direitos é, em si, uma violência. A violência não se resume a ações violentas praticadas contra os idosos. Ela também está presente na impossibilidade de o idoso buscar seus direitos”, diz Edinilsa.

Cliente preferencial?

As queixas mais comuns por parte dos idosos foram em relação a serviços como transporte – a gratuidade a que têm direito nem sempre é respeitada – e saúde. Os entrevistados foram convidados a dar notas para várias instituições públicas e as piores notas foram obtidas pela classe política e pela polícia. A Fiocruz, por outro lado, é reconhecida como uma instituição presente e eficaz.

As leis de proteção ao idoso existem – estão na Constituição e no Estatuto do Idoso –, mas prevêem uma série de diretrizes que não são cumpridas. Direitos garantidos por lei, como gratuidade nos transportes e prioridade no atendimento à saúde, nem sempre ocorrem na prática. Muitas vezes, a reivindicação desses direitos resulta em constrangimento e humilhação.

Se não forem tomadas providências, a situação tende a piorar. De 1991 a 2000, a população brasileira com mais de 60 anos aumentou 35%, enquanto a população mais jovem cresceu apenas 14%. “Não só os transportes e os serviços de saúde, mas também outros setores da sociedade, terão que sofrer mudanças para acolher o número crescente de idosos. É necessário se adaptar à realidade – a população está envelhecendo”.

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