A trajetória da saúde indígena no Brasil e o papel das pesquisas para o fortalecimento do SasiSUS foram alguns dos temas abordados no primeiro dia do seminário Avanços e Desafios da Saúde Indígena no Brasil: Contribuições dos projetos da parceria Fiocruz/Sesai. O evento, organizado pela Vice-Presidência de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde (VPAAPS/Fiocruz) e pela Secretaria de Saúde Indígena do Ministério da Saúde (Sesai/MS), teve início na terça-feira (28/11).
A abertura do encontro, que ocorreu no auditório do Museu da Vida, contou com representantes da Presidência Fiocruz, do Programa Inova Fiocruz, do Ministério dos Povos Indígenas (MPI), da Secretaria de Saúde Indígena (Sesai-MS) e da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), onde se reuniram mais de 200 pessoas, entre lideranças indígenas, pesquisadores, gestores e representantes de instituições governamentais. O vice-presidente de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde da Fundação, Hermano Albuquerque de Castro, descreveu o Seminário como “um dos eventos mais simbólicos que a Fiocruz realizou em 2023”.
“As agressões aos povos indígenas não vêm de 6 ou 60 anos – vêm de 500 anos. A colonização permanece até hoje, independente dos séculos de lutas […] É bom sinalizar a riqueza e a pujança que o Brasil tem na sua ancestralidade e cultura, que nos ensina exatamente o que significa alimento saudável e proteção das florestas e águas”, disse. Durante a ocasião, o vice-presidente também decretou o campus Manguinhos da Fundação, no Rio de Janeiro, como território indígena, onde todos são livres para debater e avançar na causa indígena, por três dias.
O presidente da Fiocruz, Mario Moreira, ressaltou o papel da Fundação na luta pela saúde e bem-estar dos povos originários. “Um dos nossos desafios, talvez o mais importante e mais complexo, é contribuir a partir dos conhecimentos e cultura desses povos originários, que muito nos ensina. Estamos juntos nesses três dias de trabalho e espero sair com grandes formulações para o aperfeiçoamento dessa política pública”, expôs.
Em sua participação, o representante da Apib, Paulino Montejo, parabenizou e agradeceu a aliança com a Fundação. “Uma questão que temos na mira permanente é a luta para que os direitos assegurados pela Constituição, que sentenciou que o Brasil é multiétnico e pluricultural, sejam efetivados […] Enquanto movimento indígena, apostamos em aprofundar cada vez nossas parcerias. As ações que a Fiocruz faz são parte de um projeto por uma sociedade mais justa, democrática, fraterna e plural”.
O secretário de Saúde Indígena do Ministério da Saúde, Ricardo Weibe Tapeba, reservou um espaço para agradecer aos colaboradores da Sesai presentes e sublinhou a importância da parceria institucional com a Fiocruz. “Esperamos fortalecer cada vez mais nossas ações de pesquisa, valorizar, prestigiar e priorizar os nossos pesquisadores indígenas. Além de, evidentemente, fortalecer as ações que estão sendo coordenadas por aliados que têm colocado a saúde indígena como prioridade”, comentou. Weibe ainda reforçou que, “de forma muito simbólica e política, a Ministra Nísia Trindade representa o retorno da ciência, que foi tão atacada nos últimos anos. A vinda dela se materializa como um aceno importante do fortalecimento da ciência”.
Já o coordenador-geral dos Direitos Sociais Indígenas do Ministério dos Povos Indígenas, Jecinaldo Barbosa Cabral Sateré, destacou as conquistas históricas dos povos indígenas. “Estar aqui na Fiocruz é dizer que aqui também é nossa casa, porque nos sentimos parte da consolidação dessa parceria. Estamos aqui para, acima de tudo, dar respostas aos problemas do nosso povo em todo Brasil – e a resposta está sendo dada com esses 20 projetos”, falou.
“Nosso compromisso é apoiar pesquisas que não só procurem tornar possível a existência do Sistema Único de Saúde (SUS), mas fundamentalmente que deem combate às inúmeras desigualdades, invisibilidade, silenciamento e extermínios que marcam a história do Brasil e, infelizmente, sabemos que continuam presentemente”, pontuou a coordenadora do Programa Inova Fiocruz, Marcia Texeira de Oliveira.
Avanços e desafios
A primeira mesa do encontro frisou relatos da luta indígena por direitos e o papel do controle social, além de pesquisas e políticas públicas em saúde indígena. Na ocasião, participaram Clóvis Ambrósio, liderança indígena Wapichana de Roraima e ex-Presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena Leste Roraima – Condisi (2000-2015), Luiza Garnelo, pesquisadora do Instituto Leônidas e Maria Deane (ILMD/Fiocruz Amazônia), e Hermano Castro.
“Na década de 60, andei por semanas para ver como era a vida da nossa população nas comunidades: ninguém tinha vez ou voz e ninguém nos respeitava. Naquela situação, senti a necessidade de pensarmos em organizar a nossa população […] Todos os presentes nesse Seminário vêm por uma causa, dizendo que estamos nos organizando cada vez mais para superar o sofrimento que passamos nesses cinco séculos”, contou Clóvis Ambrósio.
Programação
Com o objetivo de promover o debate sobre a saúde indígena no Brasil, o evento tem programação até a próxima quinta-feira (30/11).
Enquanto o segundo dia será marcado pela apresentação dos projetos, o terceiro e último está reservado para os debates e encaminhamentos das atividades dos Grupos de Trabalho Temáticos. Além disso, será lançado um documento com reflexões sobre as pesquisas, o SasiSUS e as políticas públicas que impactam a saúde indígena no Brasil. Participam das mesas de debates, grupos de trabalho e plenária final apenas os integrantes dos projetos.
No entanto, a programação também dispõe de espaço aberto ao público. Na Tenda Cultural Diálogos e Saberes, ao lado do Museu da Vida, haverá estandes com os produtos dos projetos, exposição e comercialização de produtos indígenas, além do espaço Práticas e Saberes Ancestrais Indígenas em Saúde, onde os participantes poderão vivenciar e refletir sobre os conhecimentos ancestrais em saúde.
A comunidade na Fiocruz poderá conferir, na Tenda Cultural Diálogos e Saberes, o Cine Saúde Indígena, que exibirá quatro documentários e 16 curtas, os quais, em sua maioria, foram realizados por indígenas, tendo como tema principal a saúde.