O que é depressão e como buscar ajuda e tratamento para você ou outras pessoas

“É assustador, mas comum que, não importa o que você diga sobre sua depressão, as pessoas não acreditam, a não ser que você pareça agudamente deprimido”, resumiu o escritor e jornalista americano Andrew Solomon, no best-seller O Demônio do Meio-Dia.

Os obstáculos para diagnosticar e tratar a depressão são enormes, afirma a Associação Brasileira de Psiquiatria, mesmo que essa condição médica seja comum, recorrente e crescente em seus mais diversos sintomas e impactos. Estima-se, aliás, que até 2030 ela deva afetar mais pessoas do que qualquer outro problema de saúde.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a depressão afeta atualmente quase 12 milhões de pessoas no Brasil, ou 5,8% da população, taxa superior à média mundial (4,4%) e abaixo apenas do líder Estados Unidos (5,9%). Essa condição, que não tem causa única, atinge as pessoas independentemente da idade, classe social, profissão, raça/etnia ou do gênero.

Em linhas gerais, a depressão é descrita por especialistas como um transtorno biológico no qual a pessoa se sente deprimida ou perde o interesse ou prazer em relação a algo que tinha antes, afetando diversas áreas de sua vida (profissional, pessoal, familiar, social etc.). Mas o diagnóstico é complexo: não passa por exames, mas pela análise clínica de profissionais de saúde especializados com base em sintomas, critérios diagnósticos (há quanto tempo persistem os sintomas, por exemplo), histórico familiar, gatilhos, comorbidades, entre outros pontos.E por que é tão difícil identificar e entender os sintomas e as causas do chamado “mal do século 21”? Que profissionais fazem esse diagnóstico? O que especialistas recomendam para quem busca ajuda e tratamento para si mesmo ou para outras pessoas? E quem não tem condições financeiras de pagar atendimento particular ou plano de saúde? Luto pode desencadear depressão? Por que os pacientes são estigmatizados como fracos ou sem força de vontade, por exemplo? Todos precisam tomar remédio? Fazer terapia basta para os casos mais leves?

Mulher sentada com mãos na cabeça escondendo rosto

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Legenda da foto,Segundo Organização Mundial da Saúde (OMS), depressão afeta atualmente quase 12 milhões de pessoas no Brasil

A BBC News Brasil reúne no texto abaixo respostas de especialistas e entidades de psiquiatria e psicologia para algumas das dúvidas mais buscadas sobre depressão.

E para responder brevemente às duas últimas perguntas, a Inglaterra decidiu mudar as diretrizes do sistema público de saúde nacional (uma espécie de SUS) para pessoas diagnosticadas com depressão leve. Antes de iniciarem tratamento com antidepressivos, esses pacientes devem primeiro ter acesso à terapia e a exercícios físicos em grupo, por exemplo.

O novo protocolo surge em meio ao aumento das prescrições de antidepressivos no país no fim de 2020 (alta de 6% em relação ao ano anterior), mas isso não significa, obviamente, que o tratamento com remédios como um todo esteja sendo questionado.

Um estudo publicado no fim de setembro no periódico científico The New England Journal of Medicine apontou que pessoas que permanecem usando medicamentos antidepressivos a longo prazo têm menos chance de sofrer recaída do que aquelas que decidem parar de tomá-los.

Mulher na cama

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Legenda da foto,Uma das formas mais comuns de problemas de saúde mental, a depressão é descrita como transtorno, doença, síndrome, sentimento ou melancolia

O que é depressão e quais são os principais sintomas, segundo especialistas

Uma das formas mais comuns de problemas de saúde mental, a depressão é descrita como transtorno, doença, síndrome, sentimento ou melancolia (antigo nome que se dava a ela).

“A depressão se caracteriza por uma tristeza profunda e prolongada, que faz o indivíduo perder o interesse por coisas que anteriormente eram prazerosas. Além da tristeza, que é o sintoma mais conhecido e falado, o padecente pode sofrer com alterações no sono, podendo dormir demais ou ter insônia, distúrbios alimentares, irritabilidade, fadiga, pensamentos de suicídio. Cabe ressaltar que os sintomas variam de pessoa para pessoa”, explica Antônio Geraldo da Silva, presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria, em entrevista à BBC News Brasil.

A necessidade de encontrar uma definição para uma condição tão complexa quanto a depressão é fundamental quando se deseja instituir um diagnóstico, pois só então é possível traçar um tratamento adequado, seja com remédios, terapia ou ambos, por exemplo.

O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5), da Associação Americana de Psiquiatria, traz uma série de “pré-requisitos” para caracterizar o diagnóstico formal de depressão, como a presença de cinco ou mais sintomas da lista abaixo ao mesmo tempo durante pelo menos duas semanas. São eles, de forma simplificada:

  • Sentir-se triste ou deprimido
  • Ausência de interesse e prazer em atividades que antes eram prazerosas
  • Fadiga e perda de energia
  • Alterações no apetite e no peso (ganho ou perda sem relação com dieta)
  • Dificuldade para dormir ou o oposto, dormir muito
  • Sentimentos de inutilidade e culpa
  • Problemas para pensar, se concentrar ou tomar decisões
  • Aumento da atividade física sem propósito, como ficar balançando as mãos ou os pés, andar de um lado para outro, não conseguir ficar parado em pé ou sentado.
  • Pensamentos suicidas

Mas o diagnóstico vai muito além de preencher ou não os critérios acima. Segundo Silva, “cerca de 50% a 60% dos casos de depressão não são detectados pelo médico clínico e muitas vezes o tratamento prescrito não é suficientemente adequado”.

Há diversas variáveis biológicas, neuroquímicas, ambientais, genéticas e emocionais envolvidas — e diversos tipos de depressão e de transtornos mentais. Por isso cabe a um profissional especializado investigar e identificar qual problema de saúde está afetando ou não cada paciente.

“Um aspecto relevante, por exemplo, passa pelas comorbidades. Muitas vezes, o paciente não tem só depressão. É muito comum o paciente ter depressão e problemas relacionados ao uso de substâncias, ou transtorno de ansiedade associado a um transtorno alimentar, transtorno de personalidade… A importância da avaliação, do diagnóstico apropriado com um profissional especializado se dá porque na maioria das vezes os transtornos mentais não aparecem sozinhos”, disse à BBC News Brasil Wilson Vieira Melo, presidente da Federação Brasileira de Terapias Cognitivas.

A avaliação não é feita apenas por todos esses sinais, mas também pela exclusão de sintomas, demandando diagnósticos diferenciais com outras condições médicas, como deficiência de vitaminas, alterações na tireoide e tumor cerebral, que podem apresentar sintomas semelhantes aos da depressão.

“O psiquiatra é quem pode avaliar o quadro e identificar o desenvolvimento de uma doença mental, intervindo de forma precoce e evitando seu agravamento. Sempre que notarmos o prejuízo no comportamento do indivíduo, ou seja, que os sintomas começam a atrapalhar a vida da pessoa, é a hora de buscar um psiquiatra para tratamento e manejo correto”, afirma Silva, da Associação Brasileira de Psiquiatria.