Um conjunto de 18 mutações no Sars-Cov-2 que ainda não haviam sido identificadas e detalhadas por cientistas foi descoberto por pesquisadores do laboratório do Instituto de Ciências Biológicas UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais).
Sars-Cov-2 é o nome oficial do vírus que causa a covid-19.
A descoberta do conjunto de mutações foi divulgada na quarta-feira (07/04). De acordo com uma nota publicada pelos pesquisadores, ela pode indicar a existência de uma nova variante do vírus em Belo Horizonte (MG).
Se confirmada, ela pode entrar em listas internacionais de variantes conhecidas do novo coronavírus. Até o momento, a OMS (Organização Mundial da Saúde) e o CDC (Centro de Controle e Prevenção de Doenças) dos EUA destacam cinco variantes entre as mais preocupantes:
B.1.1.7 (detectada inicialmente no Reino Unido)
– P.1 (conhecida como a variante de Manaus)
– B.1.351 (África do Sul)
– B.1.427 (Estados Unidos)
– B.1.429 (Estados Unidos)
Mas é importante lembrar que é comum, durante qualquer pandemia, que vírus sofram mutações conforme são transmitido de pessoa para pessoa.
A maioria dessas mutações não costuma preocupar. Algumas, no entanto, são consideradas críticas quando alteram índices como transmissibilidade (ou a facilidade com que a doença se espalha) e mortalidade (o número de mortes relacionadas ao vírus).
No Twitter, o biólogo e divulgador científico Atila Iamarino escreveu sobre o assunto.
“Enquanto o plano de ação federal for promover o contágio, o que coloca vulneráveis, curados e vacinados em contato com o coronavírus, teremos variantes sendo geradas. Evolução é implacável e estamos selecionando vírus mais transmissíveis e que reinfectam”, escreveu.
Ainda não há informações suficientes para saber se as mutações descobertas em Belo Horizonte de fato constituem uma nova variante. Assim, cientistas ainda não podem afirmar se ela é ou não mais transmissível ou letal.
Mas os pesquisadores afirmam que “os resultados da pesquisa requerem urgência de esforços de vigilância genômica na região metropolitana de BH e estado de Minas Gerais” para avaliação da situação.
O monitoramento das alterações em códigos genéticos ajuda a acompanhar casos preocupantes. O procedimento também é essencial para embasar medidas para bloquear a transmissão da doença.
O problema é que, por falta de recursos, o Brasil e o restante da América Latina ainda enfrentam dificuldades na chamada “vigilância genômica” – outro termo para o monitoramento de novas variantes do vírus.
“A América Latina precisa de uma vigilância genômica forte. Na maioria dos países, ainda é mínima”, escreveu no Twitter, no início de março, a epidemiologista Zulma Cucunubá, especialista em doenças infecciosas e saúde pública da universidade Imperial College London, no Reino Unido.
“Não sabemos o que está acontecendo com as variantes do SARS-CoV-2 na região.”
O que diz a pesquisa feita em BH
O estudo foi realizado a partir de amostras clínicas coletadas na região metropolitana de Belo Horizonte, que foram usadas para o sequenciamento de 85 genomas de Sars-Cov-2 entre outubro de 2020 e março de 2021.
O sequenciamento do genoma permite conhecer detalhes sobre a composição genética do vírus e possíveis mudanças – ou mutações – em seu funcionamento e estrutura.
Na empreitada, os pesquisadores encontraram dois novos genomas com um conjunto de 18 mutações desconhecidas. É essa a descoberta que, segundo eles, “caracteriza possível nova cepa do Sars-CoV-2”.
Essas mutações foram encontradas em dois genomas de amostras não relacionadas geograficamente – distantes uma das outras – que coletadas nos dias 27 e 28 de fevereiro de 2021.
Assim, “não existem evidências de ligação epidemiológica entre ambas, como parentesco ou proximidade geográfica entre os infectados, o que reforça a plausibilidade de circulação dessa nova possível variante”, explica o professor Renato Santana, do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) da UFMG, que participou do estudo.
Os genomas sequenciados na UFMG mostraram a presença de novas mutações que podem ser preocupantes. Duas delas estão no que os cientistas chamam de posição E484 e posição N501.
Eles explicam que mutações nas posições E484 e a N501 são consideradas críticas porque aparecem justamente no gene que codifica a proteína da espícula do vírus (proteína S). Ela é utilizada pelo vírus para invadir nossas células e é associada tanto a transmissibilidade quanto ao chamado escape imunológico (ou seja, a possibilidade de reinfecção).
Outras mutações nessas mesmas posições, a E484K e a N501Y, estão presentes em variantes já consideradas preocupantes, como a P.1 (Manaus) e a B.1.1.7 (Reino Unido).
Nesse contexto, os pesquisadores lembraram que a mutação N501Y, presente nas linhagens acima (P.1 e B.1.1.7), foi recentemente associada a um aumento de aproximadamente 60% no risco de mortalidade em indivíduos infectados no Reino Unido.
Este estudo ainda não passou por revisão de outros cientistas e também não foi publicado em um periódico científico, mas os pesquisadores afirmam que logo será submetido para publicação.