Durante três dias, a Feira de Soluções para a Saúde – Zika promoverá um espaço de divulgação e compartilhamento da ciência e inovações tecnológicas, sociais e de serviços relacionadas à tríplice epidemia, na cidade de Salvador, Bahia. A articulação aproximará pesquisadoras e pesquisadores, instituições do setor público e privado, governo local, movimentos sociais e outros atores que tenham experiências referentes à zika e ao controle de seu vetor, e está prevista para ocorrer entre os dias 8 e 10 de agosto. A feira é uma iniciativa da Fiocruz e de instituições parceiras e visa contribuir para o avanço do conhecimento aplicado à zika e doenças correlacionadas, promover educação em saúde, firmar parcerias, e potencializar diálogos institucionais na área de interesse.
A 6ª Sala de Situação Direitos Sexuais e Reprodutivos das Mulheres no contexto da Síndrome Congênita do Zika será parte da programação da Feira. A decisão foi tomada pelo coletivo de 30 organizações de mulheres presentes no 5º encontro, transcorrido no Centro de Informações das Nações Unidas no Brasil (Unic-Rio), na cidade do Rio de Janeiro, em março. O Comitê organizador do evento fez a proposta às agências da ONU participantes e às representações dos coletivos, que aceitaram o convite.
Além da região Nordeste, outras quatro feiras estão programadas para acontecer nas regiões Norte (Manaus), Centro-Oeste (Brasília), Sudeste (Rio de Janeiro) e Sul (Curitiba) do país. A Presidência da Fiocruz, a Gerência Regional de Brasília (Gereb/Fiocruz) e o Instituto Gonçalo Moniz (Fiocruz Bahia) constituem o Comitê Nacional de organização pela Fundação, juntamente ao Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), e outras instituições.
Mobilização social
A Fiocruz Brasília e o Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para Saúde (Cidacs) da Fiocruz Bahia estão mapeando atores e tecnologias nacionais e internacionais envolvidos com a temática. Será feita uma triagem das experiências a serem apresentadas no evento e no mês de maio será organizada uma oficina preparatória. Nela, estarão reunidas pastas governamentais dos setores educação, saúde, assistência, meio ambiente; movimentos sociais, em especial aqueles ligados aos direitos das mulheres; academia; complexo produtivo; meios de comunicação e representantes do poder judiciário brasileiro e Ministério Público.
Para Maria do Socorro de Souza, pesquisadora da Fiocruz Brasília e uma das responsáveis pela organização, é estratégico que a próxima sala de situação aconteça durante a Feira para ampliar a visibilidade das necessidades sociais e demandas das mulheres, garantindo sua participação em espaços públicos na busca de soluções. Ela lembra que o olhar prioritário para os seus direitos sexuais e direitos reprodutivos foi um dos objetos do Acordo de Cooperação Técnica Fiocruz-UNFPA para cinco anos, que aborda também direitos de cidadania da juventude.
“Esta crise sanitária mudou drasticamente a vida das mulheres e de suas famílias e trouxe sequelas irreparáveis para a vida de muitas crianças. Muitas têm experimentado o sofrimento mental decorrente de perdas afetivas, financeiras e patrimoniais. No Nordeste, a situação é ainda pior devido à pobreza, à desigualdade e as condições sanitárias, sobretudo a precariedade no saneamento básico em áreas urbanas e rurais”, afirmou.
Segundo dados divulgados durante a 5ª Sala de Situação, a Bahia – estado que sediará a primeira edição da Feira – possui o maior número de casos confirmados entre os estados brasileiros, e possui notificações em 215 municípios.
Zika e os direitos das mulheres
A sala de situação é uma ação estratégica de diálogo e coordenação de ações da sociedade civil, academia, instituições públicas e Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), ONU Mulheres, Organização Pan-Americana da Saúde (Opas/OMS) em favor da saúde e dos direitos das mulheres, grupo mais afetado pela epidemia de zika. O espaço foi criado em 2016 com o objetivo de organizar as demandas do segmento e propor ações junto aos três poderes da República e Ministério Público. Órgãos federais e estaduais de saúde também são convidados a participar.
No segundo dia de evento, durante a 5ª Sala de Situação, o chefe de gabinete da Presidência da Fiocruz, Valcler Rangel, expôs as principais iniciativas que vem sendo desenvolvidas pela instituição, com ênfase no trabalho realizado pelo Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para Saúde (Cidacs) da Fiocruz Bahia.
Entre os temas pautados no encontro, foi grifada a urgência da qualificação dos dados relativos à epidemia, especialmente no que diz respeito a indicadores de renda, raça e etnia, e informações sobre o número de abortos. Levantamento apresentado na ocasião pelo consultor nacional de arboviroses da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas/OMS Brasil), Carlos Albuquerque de Melo, revelou que de 5.194 casos suspeitos da síndrome congênita do zika, 84,4% das mães se declararam negras (pretas e pardas), 22,6% possuem entre 15 e 19 anos. Quase 49% eram solteiras no momento do parto. Os dados foram registrados pelo Ministério da Saúde no período de janeiro de 2015 a fevereiro de 2016 e ainda não foram publicados oficialmente.
Agenda de prioridades
As ações consideradas prioritárias foram organizadas segundo quatro eixos estratégicos: Promoção e Defesa de Direitos; Informação, Educação e Comunicação; Advocacy e Ações Intersetoriais; e Articulação e Mobilização.
Foram feitas críticas à “ausente ou escassa informação” disponível a respeito da epidemia nos serviços de saúde, bem como apontada a “pouca articulação” entre os serviços de atenção básica com a rede de atenção psicossocial. A urgência de métodos diagnósticos mais rápidos e confiáveis que permitam a identificação precoce da síndrome congênita do vírus zika nas gestantes também foi classificada como um dos gargalos para efetivação dos seus direitos.
No primeiro eixo, de Promoção e Defesa de Direitos, frisou-se a importância de se verificar as repercussões da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da Reforma da Previdência nos benefícios sociais relacionados à síndrome da zika, bem como promover ações de incidência junto às Defensorias Públicas e Ministério Público.
No campo da informação, educação e comunicação, propôs-se a produção de relatos de violações sobre mulheres e o zika a partir da Plataforma Brasileira de Direitos Humanos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais (Plataforma Dhesca Brasil), além da confecção de material educativo para mulheres e profissionais de saúde. Neste ponto, depoimentos reiteraram o baixo acesso à informação que as mulheres possuem acerca de seus direitos, como o atendimento humanizado, aos insumos contraceptivos – caso decida não engravidar -, sobre o risco de transmissão sexual da doença, entre outros.
Uma atuação mais decisiva para implementação da Educação Integral em Sexualidade nas escolas foi uma das pautas do eixo Advocacy e Ações Intersetoriais, juntamente às políticas públicas que facilitem o acesso de adolescentes aos métodos contraceptivos, especialmente os de alta eficácia.
Como proposta do eixo Articulação e Mobilização, foi definida a criação de três grupos de trabalho destinados a protagonizar ações ligadas aos temas “saúde – prevenção e monitoramento”; “jurídico”; “epidemiologia e pesquisas com abordagem de gênero”, com representações das organizações participantes. Todos os grupos irão trabalhar a partir de uma perspectiva de direitos humanos, gênero, faixa etária e interculturalidade.
*A Cooperação Social da Presidência da Fiocruz é um dos órgãos da Fundação Oswaldo Cruz que participam da implementação do plano de trabalho com o Fundo de Populações das Nações Unidas