Ivanir Ferreira, do USP Online
Pacientes que procuram as Unidades Básicas de Saúde (UBS) podem contar com mais um aliado para o cuidado com a saúde. Bastante difundidas em países asiáticos, as práticas corporais (massagem, yoga, alongamento, dança, lian gong, tai-chi, meditação, acupuntura, entre outras) têm se mostrado eficientes no enfrentamento do sofrimento e da dor.
Essa é a conclusão de uma pesquisa coordenada pela professora Yara Carvalho, do Departamento de Pedagogia do Movimento do Corpo Humano, da Escola de Educação Física e Esporte (EEFE) da USP em Unidades Básicas de Saúde do Butantã – zona oeste de São Paulo. Os resultados apresentados mostram que houve diminuição nas dores do corpo, redução na ingestão de remédios e na frequência de procura por consultas médicas, além de melhora na qualidade de vida das pessoas, sobretudo no aspecto social, porque elas passaram a estabelecer mais vínculos sociais inter e extra grupo.
Durante cinco anos – entre 2010 e 2014, estudantes de Educação Física acompanharam um grupo de pessoas de diferentes faixas etárias, gêneros e níveis socioeconômicos que faziam práticas corporais em seis UBSs do bairro do Butantã, no Centro de Saúde Escola Samuel Pessoa e no Centro de Saúde Escola Geraldo de Paula Souza. A ideia era conhecer os benefícios das práticas corporais e, ao mesmo tempo, descobrir como o profissional de educação física poderia ser inserido na equipe de saúde, a exemplo do que já ocorria na interação de outros profissionais como enfermeiros, fonoaudiólogos, psicólogos e fisioterapeutas.
Nas rotinas das UBSs, foi possível observar que o usuário que procurava o atendimento médico por causa de uma queixa pontual (uma dor de cabeça, por exemplo) trazia também consigo outras carências que iam além do atendimento médico convencional. O paciente queria ser ouvido, sofria de solidão parental e tinha necessidade de convívio com outras pessoas. Conjuntamente com a avaliação médica, entrava a atuação do profissional de educação física que, depois de checagem dos determinantes sociais de saúde (condições socioeconômicas, culturais e ambientais gerais) desse paciente, propunha algum tipo de atividade: era sugerido que a pessoa fizesse parte de algum grupo de cuidado com o corpo/práticas corporais como medida associativa para amenizar dores e, algumas vezes, resolver o problema apresentado na consulta. Dessa forma, uma dor de cabeça causada por problemas circulatórios, posturais, neuromusculares, dependendo de sua origem, poderiam ser indicadas práticas corporais como caminhada, dança ou massagens, explica Yara.
Modo de viver privilegiado
Há uma recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) para que os indivíduos façam com regularidade atividade física e práticas corporais a fim de manter a saúde. Porém, existe uma diferença no entendimento entre os conceitos: a atividade física está vinculada à física newtoniana e associada ao gasto energético e à ideia de ingestão calórica; as práticas corporais, por sua vez, privilegiam o modo de viver das pessoas e levam em consideração o ser humano em movimento e sua gestualidade. Tais atividades promovem o despertar da consciência e do cuidado de si e com o outro, levando as pessoas praticantes a uma maior sociabilização, explica Yara.
Quando uma pessoa decide fazer dança, por exemplo, ela não o faz simplesmente porque quer perder peso. Há outras motivações que são determinantes da saúde, como as relações que se constituem a partir daquela ação, o encontro de pessoas para um bate papo e o sair de casa. Ao todo, existem mais de trezentas práticas em modalidades orientais e ocidentais: capoeira, danças, tai chi chuan, shiatsu, yoga, massagem, caminhada, jogos, brincadeiras, alongamento, lian gong e ginástica.
De acordo com a pesquisadora, o trabalho feito nas UBSs trouxe uma maior conscientização sobre a importância da participação de profissionais de educação física como forma de intervir no processo do adoecimento. A associação de práticas corporais com o atendimento clínico médico pode ser uma estratégia de cuidado para ampliar os níveis de saúde da população. “Os resultados foram satisfatórios para todos”, observa.
Mas além desta questão, considerada relevante, Yara queria problematizar as políticas de formação voltadas para a capacitação e sensibilização de estudantes de educação física na atuação em saúde pública. Segundo ela, nos últimos anos, houve uma preocupação dos Ministérios da Saúde e Educação quanto à formação de equipes multiprofissionais para atuar na saúde pública. “E foi neste contexto que a pesquisa se desenvolveu”, conclui.
O projeto de pesquisa Políticas de Formação em Educação Física e Saúde Coletiva: atividade física/práticas corporais no SUS foi financiado pela Capes e foi realizado simultaneamente em três estados brasileiros: São Paulo, pela USP, Rio Grande do Sul, pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRS), e Espirito Santo, pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).
Mais informações: (11) 3091-3135 / 3091-2126, emailyaramc@usp.br, com a professora Yara Carvalho